O Caçador de Borboletas.
Mais um noite nublada, a escuridão toma conta.
E naquela casa, onde ratos e baratas dividem o teto,
onde a imundice e a sordidez encontraram abrigo,
pode-se ver, no canto da sala escura atrás da fumaça,
que se alastra e encobre a pouca luz do ambiente,
um homem, na boca um cigarro, vermelho na ponta.
O brilho das cinzas nascendo nas trevas desponta,
reluzindo brevemente a face velha e puída daquele
que se sentava sob a cadeira de couro marrom. Seus
olhos fixados no objeto cilíndrico e transparente na
mesa do cômodo ensombrado, observava as borboletas.
Seu olhar hipnotizado pela dança embaralhada e tonta.
Mas, por mais que ele amasse a visão, ela era uma afronta!
Pois, seu desejo, seu único desejo, seu mais sincero desejo...
era que as borboletas presas tapassem o buraco em seu peito.
Mas sempre que ele observava os belos movimentos, as lindas
batidas de asas em uma sincronia caótica, ele se deparava com
um vazio sempre maior. A visão, o seu ávido ímpeto confronta...
Agora de dia, o sol forte como uma bomba nuclear no céu reluz,
não há sinal de nuvens, e nem mesmo de uma mísera brisa, o calor
maltratava o pescoço nu do velho que corria desembestado pelos
prados verdejantes, com uma rede na mão e um sonho no coração.
Procurando e capturando com eficácia suas borboletas mágicas.
E dentro de si, a ilusão, como cogumelos após a chuva, se reproduz...
Ele as caça na intenção de que no fim do dia, dessa vez, veja a Luz...
Seu ardor não se apaga, só aumenta, sua rede corta o ar com rapidez,
seus braços e pernas se movimentam com intrepidez jovial, porém,
é em sua alma que reside seu verdadeiro combustível, que aquece e
alimenta todo este trabalho, como as raízes de uma árvore podre...
Como Meduza, Lorelei, ou Dalila; sua velha alma, a Serpente seduz.
Triste vida, triste empenho, triste fim... assim é que se traduz
a passagem deste homem por esta terra, pois, cego em suas
paixões não pode ver que a única coisa que saciaria seu desejo,
que extinguiria seu vazio, que mudaria sua vida soturna, estava
bem na sua frente, todos os dias, naqueles prados verdejantes,
onde ele caçou vãs borboletas, estava presente, uma imensa Cruz...