EIS O HOMEM
 
 
 
 
Eu te plasmei no ventre da sociedade
 “Surdos, ouvi, cegos, olhai e vede!”
Tal como um mártir, preservei a verdade
E, como um rio, saciei tua sede.

Afastei de tua estrada todo espinho
Para que neles teu pé não pisasse
Postei-me em tua frente como escudo
E, com carinho, beijei-te a  face

Eu te dei voz quando eras mudo
Fui teu ouvido quando eras surdo
Para que ouvisses e falasses
E abri o mar para que passasses

E, por mais que me molhassem,
As lágrimas e suor que derramei
Tuas lágrimas com amor eu enxuguei
Embora as minhas derramassem

O servo amado, a amar veio
Arrastar tamanha dor na cruz
Deixar seu cântaro se partir ao meio
E seu amor se transformar em luz

 “Eu te segurei pela mão e te salvei”
Por te amar eu abracei a cruz
Abri teus olhos cegos à luz
Poupei tua vida, mas a minha não poupei

Fui eu que teus grilhões quebrei
Abrindo uma passagem através do mar
Antes de me amares, eu te amei
E o amor que não me deste, eu te dei

Eu irriguei a terra com meu sangue
E ao mundo entreguei a minha luz
Mas na cabeça puseste-me espinhos
E em minhas costas, uma pesada cruz

Ainda quando estavas no escuro
E quando gemias em prantos
Te ofereci um porto seguro
E a mão te estendi tanto, tanto...

Não me deste o valioso perfume
Do amor, quanto esperei; quanto!
Nem me deste o ouro fino
Deste-me de beber amargo vinho
Eu te dei amor; tanto amor, tanto!

Eu sou o pão e o mel que ofereci
Teu guia, o teu caminho, tua luz
E tu me foste os espinhos, as trevas, a cruz
E a taça de fel que eu bebi.