MONÓLOGO: 04.( Coisas de Infância ).
Bom dia vovô Anófele!
Parece um pouco ocupado?
Vim aqui lhe visitar,
Só pra nós dois conversar,
Como o senhor tem passado?
E esse monte de papel,
O que o senhor está olhando?
Um tanto de fotografias,
São elas de sua família,
Parece que ta chorando?
Não quero ver você triste,
Pelo menos por agora,
Pedi mamãe pra lhe ver,
Só pra ouvir de você,
Todas aquelas história.
Sabe Zezinho, meu filho,
To só aqui relembrando,
Das coisas boas da vida,
Que se vão sem despedida,
E deixa a gente lamentando.
Sabe que ainda me lembro,
Do meu tempo de criança?
Das carrancas de papai,
Pena que não volta mais,
Mas não me sai da lembrança!
De quando de madrugada,
Já tinha o dia marcado,
Mamãe levantava primeiro,
Sacudia o mosquiteiro,
Ponha todos acordados.
Íamos todos pra sala,
Sentava-mos no assoalho,
Toda renca de irmãos,
Com medo do cinturão,
Pra sair dava trabalho.
Formava-mos ali um círculo,
Ali a coisa ficava feia,
Assistia-mos a olho nu,
O preparo daquele angu,
Uma caneca bem cheia.
Era remédio pra verme,
Feito de leite com mentruz,
Mamãe batia até virar creme,
Hoje minhas pernas tremem,
Só de lembrar meu Jesus!
Pensa numa coisa ruim!
Inguiava só em sentir o cheiro,
Dava-nos até calafrios,
Nós com o estômago vazio,
Beber aquele troço inteiro!
Era posto em um caneco,
Cada um sua medida,
Um gosto horripilante,
Era muito torturante,
O tal remédio pra lombrigas.
E ai do que vomitasse,
Toda aquela gororoba,
Tinha que beber novamente,
O mentruz com leite quente,
Além de tomar uma sova.
Tinha um tal de tiro seguro,
Que era ainda pior,
Uns comprimidos grudados,
Com um cheiro adocicado,
Fedido que só ele só.
Depois dali que era osso,
Tinha que ficar amoitado,
Se não perdia o efeito,
Era cada preconceito,
Numa rede enfurnado.
Disso não tenho saudade,
Pois me era uma tortura,
Parece até por capricho,
Todo mês fazia isso,
Uma empreitada dura.
Porem tem as outras coisas,
Que sinto falta de verdade,
Das brincadeiras de pião,
Olha tinha cabra bom,
Há! Disso tenho saudade.
Do banho de igarapés,
Do peixe assado na brasa,
Do pastelzinho da esquina,
Com suco de tamarina,
Que sempre tinha em casa.
Do jogo de futebol,
Descalço de pés no chão,
Nas noites de lua cheia,
Aquela bola de meia,
Na frente do barracão.
Ali os pais conversavam,
Contando suas histórias,
Nós brincando ouvia tudo,
E tinha cada absurdo,
Que não me foge a memória.
Ali se dormia cedo,
Não tinha televisão,
Porem de manhã bem cedo,
Como estalar de dedos,
Corria pra comprar pão.
Menino de vida simples,
Em humilde moradia,
Era feliz pode crer,
Não como hoje se ver,
Essa louca correria!
Moleque tinha que ser macho,
Pra agüentar o batente,
O serviço era bem feito,
Estava cedo ao pé do eito,
Fosse chuva ou sol quente.
Nunca vi um vídeo game,
Na minha época não existia,
Pra gente poder brincar,
Tinha que improvisar,
Com brinquedos que se cria.
Fazíamos travessuras,
Com brincadeiras sadias,
Com toda simplicidade,
Ali não se via maldade,
Na mais perfeita harmonia.
Estou de cabeça branca,
E fico aqui imaginando,
Esses cabelos grisalhos,
E até um tanto falhos,
Sinto o fim se aproximando.
É desse jeito a vida,
E quem fica pra semente?
Cada um tem seu momento,
Depois tudo é esquecimento,
Logo a pós a despedida!
Por isso não me lamento,
Por tudo que já vivi,
Sei que pouco vou durar,
Mas sei ninguém vai me tirar,
As coisas que aprendi.
Cosme B Araujo.
04/03/2013.