MONÓLOGO: 02.( Confissões de Camponês ).
Ai que saudade que tenho,
De minha vida no campo,
Quando em plena madrugada,
Pisava a relva molhada,
Gelada e cheia de encantos.
Ali sim a felicidade,
Estava dentro da gente,
Quando as horas de calor,
Mergulhava sem pudor,
Nas frias águas correntes.
Eu ainda era menino,
Mas me lembro muito bem,
Quando toda garotada,
Reunia-se agitada,
Sei que eram quase cem.
Vivia-mos ali todos perto,
Em uma bela amizade,
Lembro Dona Terezinha,
Chamava-me pra cozinha,
Pra contar as novidades.
No velho fogão a lenha,
Toda manhã bem cedinho,
Caiam como uma luva,
Aqueles bolinhos de chuva,
E um café bem quentinho.
Há! Sentia-me a vontade,
Lá na casa de farinha,
Pra embrulhar tapiocas,
Nas folhas de sororoca,
Deixando-a bem fechadinha.
E na moagem de cana,
No rude engenho de madeira,
Lá o caboclo suava,
Ali o suor pingava,
Não se via brincadeira.
A jornada era longa,
Dez horas e às vezes mais,
Garapa e fino melado,
Ali o mestre Osvaldo,
Dava o ponto e tudo mais.
Menino vivia as soltas,
A correr pelo terreiro,
Não havia confusão,
Vivia-mos como irmãos,
Sempre perto o tempo inteiro.
Confesso que ainda sinto,
O cheiro do chão queimado,
Quando a chuva caia,
O cheiro de terra subia,
Deixando todos encantados.
Logo se via na mata,
O esturrar do Bugiu,
Parecendo anunciando,
Que o inverno está chegando,
Para alimentar os rios.
Mesmo criança me lembro,
Do que não tenho por aqui,
Eu pegava anzol e linha,
Equipava uma varinha,
Só pra pescar lambari.
No caminho da escola,
Um pequeno Tapiri,
Diferente de agora,
Aquela vida de outrora,
Que eu nunca me esqueci.
Caminhava todo dia,
Com a cartilha de abc,
Quando Dona Preciosa,
Uma mulher rigorosa,
Nos instigava a aprender.
Passou o tempo e cresci,
Vim na cidade morar,
Abandonei meu torrão,
E pra vida no sertão,
Nunca mais pude voltar.
Hoje aqui na cidade,
Condoí-me o coração,
Por ver essa correria,
Enfrentada todo dia,
Por toda a população.
Já vivi muitos janeiros,
Plantado neste lugar,
Mas aguardo um belo dia,
Que terei minha alegria,
De meu cantinho retornar.
Pra longe dessa loucura,
Distante de arranha céu,
Olha! às vezes fico tonto,
Quando olho com espanto,
Quase me cai o chapéu.
Não consigo acostumar,
Aqui tudo é diferente,
Só vale quem tem dinheiro,
Eu que sou pobre roceiro,
Parece até nem ser gente.
A vida por essas bandas,
Com a de lá nem se compara,
Vivo mas sem confiança,
Aqui se ter segurança,
Acredite é coisa rara.
Sem contar a barulheira,
No ruge ruge de gente,
Não é querer falar mal,
Desse barulho infernal,
Que nos deixa até doente.
Aqui o céu é bem turvo,
Não se ver a claridade,
Falta-me às vezes o ar,
Quando tento respirar,
Ai me bate a saudade.
Saudade de tudo aquilo,
Que por lá deixei um dia,
Vivendo aqui obrigado,
Pelos anos torturado,
Tão cheio de nostalgia.
Ta certo que vivo aqui,
E não esqueço minha raiz,
Mesmo morando na roça,
Numa humilde palhoça,
Eu era bem mais feliz.
Aqui eu tenho conforto,
Mas não tenho liberdade,
Vivo como um presidiário,
Tanto em casa ou no trabalho,
Nessa vida de cidade.
Já o tempo se aproxima,
Que irei me aposentar,
Ai então com certeza,
Vou voltar pra natureza,
Meu humilde e eterno lar.
Ali quero aproveitar,
Pra matar minha saudade,
Longe das tecnologias,
Que a muitos atrofia,
Como aqui na cidade.
Quero voltar a beber,
Da água vinda da fonte,
Poder ouvir o Rouxinol,
Assim no raiar do sol,
Que renasce atrás do monte.
Será ali com certeza,
Que terminarei meus dias,
E da vida na cidade,
Não sentirei mais saudades,
Terei de volta a alegria.
Neste pequeno relato,
Abri por inteiro o coração,
Confesso a primeira vez,
Que humilde camponês,
Fez-lhes intensa confissão.
Cosme B Araujo.
26/02/2013.