ROTOS E TOSCOS
R O T O S E T O S C O S
Antes sibilava o som de asas do futuro
Agora um tropel de casco de cavalos é audível
Avança o séquio do intendente
Os apaniguados estão protegidos das intempéries
Os vassalos são agrupados em bandos
Ainda há os que fazem rufar os tambores
São os mesmos que nada são
Nem ao menos se alimentam de côdea de pão
Nas vestimentas a sorte ou azar
Os paramentados em couro são heróis
Os rotos e toscos vão à frente
São as buchas de canhão
Quando em combate morrem primeiro
Se vacilam, ante um perigo maior são chicoteados
Recuar significa a morte
Não podem ser fracos
Sempre impelidos rumo ao inimigo
Nas conquistas a eles só promessas
Nas derrotas todas as culpas
Nas emboscadas suportam o revés
Estão sempre em cruzadas que não são suas
Exército sem pátria e sem bandeira
Do âmago das suas trincheiras vêm vozes indecifráveis
Seus lençóis são os cascalhos do fundo das valas
Complacência! Só no surdo choro solitário
Ninguém lhes ouve o clamor de misericórdia
Se surgem vagas, recrutam-se subservientes
Lutam com armas ou as próprias mãos
Detê-los é quase impossível, pois a morte lhes é um alívio
Seu comandante é um néscio
Em suas fileiras viaja o desdém à morte
Sua glória está no uso da mortalha
Sua última réstia de luz é a fogueira de seus ossos
Jazem suas cinzas em covas rasas
(dezembro/1992)