Sou do interior
Sou mesmo do interior
Da roça, do mato brabo
Já comi muita galinha
Torrada na panela de barro
Até mesmo a farinha
Minha mãe era quem fabricava
Comi muito murici
Guajiru e guabiraba
Tomei muito banho de chuva
Andei descalço na lama
Fui pra o rio tirar junco
Pra fazer colchão pra cama
Brinquedo a gente não tinha
E só no final do ano
Tia Nila nos prensenteava
Com uma boneca de pano
Tão linda!Era perfeita!
Posso afirmar sem engano
Remédio era só do mato
Para curar toda mazela
Lambedor para o catarro
Que grudava na titela
Raspa de ameixa sarava
As perebas da canela
Cozinhavámos sempre a lenha
As delícias do roçado
A mistura era do terreiro
Que mamãe tinha criado
A luz era de candeeiro
A luz elétrica ali ainda não havia chegado
Lavava roupa no rio
Ia eu e ia mamãe
Por ali era estrada
E quando um homem se aproximava
Por trás da moita perguntava;
Tem mulher tomando banho?
A minha mãe costurava
Pescava e criava galinhas
No roçado ela plantava
Roça pra fazer farinha
Mas, minha maior riqueza
Era minha doce rainha
A água para o consumo
Era trazida das cacimbas
Do olheiro da vertente
Em casa guardada em pode
Ou em cabaço de cangote
Pra matar a sêde da gente
E quando a noite chegava
A meninada juntava
Era grande a brincadeira
Durava quase a noite inteira
No terreiro lá de casa
De tudo a gente brincava
Cresci ali sem ter luxo
Mas, amor não me faltava
A comida nem sempre enchia o bucho
Mais a felicidade completava
E as dificuldades que surgiam
O amor mesmo curava
Do interior é minha raiz
No coração guardo a lembrança
Daquele tempo feliz
O melhor foi a minha infância
E quando olho para trás
Ainda quero ser aquela criança..