Desafio: Compadre Lemos X Seu Ribeiro
LEMOS
Não sou nordestino nem sou cangaceiro
Pois eu sou de Minas, sem mar e sem cais.
Mas sou cantador, como foram meus pais,
Agüente o tranco de um bom mineiro.
Eu nunca cantei para ganhar dinheiro
Meu verso só serve pra desafiar.
Então, cantador, você vai encarar
Quem chega de fora, e vem provocando?
Se não tem coragem, eu sigo rimando,
Propondo um galope, à beira do mar!
RIBEIRO
Nasci como nasce qualquer pecador
Distante da praia, em Minas Gerais;
Eu sou da cidade, nortista é meus pais,
Mais tenho o legado que um bruxo deixou.
Pra arranjar intriga e abater cantador,
Eu já sou de casa, vim me apresentar
Pra mode sua crista um pouco abaixar.
Meus versos me servem pro que eu quiser;
Pra ganha dinheiro, cachaça ou mulher
Fazendo um galope à beira do mar.
LEMOS
A coisa tá boa e vai ficar melhor
Parece que enfim eu topei um poeta
Aqui, um pedala outro é bicicleta
E seu verso fraquinho eu já sei de cor.
Meu verso é poder, é martelo de Thor
Segura, seu mano, para não chorar
Aprende ou se cala, porque vou rimar!
A sua coragem, no entanto, eu louvo:
Pintinho poeta, na casca do ovo,
Cantando galope na beira do mar!!!
RIBEIRO
Comigo na bala, tu canta mió,
Que contigo bato de peito aberto;
O seu canto torto com jeito acerto,
De cor e salteado, na escala maió.
Bater num coitado, às vezes, dá dó,
Mas o galo, com o tempo, precisa apanhar
E ir pra panela pra num esperdiçar.
Ainda sou moço, mas tenho mistério
Pra te capinar, capim de cemitério,
Fazendo um galope na beira do mar.
LEMOS
Compadre, desculpe a minha demora
Trabalho me prende na segunda feira.
Mas cedo ou tarde, com rima certeira
Te pego de jeito, não vai meia hora.
Se quer prosseguir, então vamos embora
Se vou perder tempo, que seja a rimar
Em qual cemitério eu vou te encontrar,
Caveira danada, seu resto de osso?
Meu verso te pega, te entorta o pescoço,
Cantando galope à beira do mar!!!
RIBEIRO
Meu Deus, como é triste ter que jogar verso
Com um cabra que, de tão ruim violeiro,
Precisa fazer bico até de coveiro
E mesmo assim num conhece o processo,
Pois tudo que fala me soa indigesto.
Olha, eu nunca que vi querer tanto exumar
O corpo alheio sem antes enterrar.
Seu moço, repare melhor no que diz,
Pois eu não nasci pra ensinar aprendiz
Cantando um galope na beira do mar.
LEMOS
Você me ensinar, só se for no outro mundo
Depois que meu verso tiver te esfolado
Sai fora, seu moço, poeta engasgado
Seu verso é tão raso, o meu é profundo!
A Filosofia do verso fecundo
Eu não perco tempo, não vou te passar,
Mesmo porque, você não sabe guardar
Nem mesmo as letras do abecedário
E quer enfrentar poeta lendário,
Cantando galope na beira do mar!!!
RIBEIRO
Eu ainda tão moço, já dano trabalho!
Me lembro do menino de Nazaré,
Quando se perdeu de Maria e José,
Foi dando conselho e ensinando vigário.
Eu sei respeitar seus cabelos grisalho,
E não vou surra-lo até se acabar
Prefiro deixa-lo a se vangloriar
De um conhecimento que não tem poder
Pra dá entendimento nem mesmo a você
Cantando um galope na beira do mar
LEMOS
Trabalho dá mesmo menino pequeno
Pois mija na cama, e quer mamadeira
E tem coqueluche, chulé, caganeira!
E eu que sou velho, desse mal não peno!
Compadre, cuidado, vigia o veneno
Sou cobra riúna, se eu te pegar
No pé do pescoço é que vou te ferrar!
Pois cantar de repente é o meu trabalho
Respeita, menino, o poeta grisalho
Que canta Galope, à beira do mar!
RIBEIRO
O velho é esforçado mais já anda lento
Pra seguir ao lado, cruzando o estradar.
Eu pareço moço, pois sei remoçar.
Aprendi ser velho, mas não me aposento,
Você está velho mas não tomou tento,
E eu tenho juízo pra dar e sobrar
Meu verso preciso, basta pra agradar;
A sua rima carece de ter cabeçalho
De ter roda-pé e até comentário,
Cantando um galope na beira do mar
LEMOS
Seu moço, cê erra na sua poesia
Dizendo que o velho é um cabra lento
Sou raio, corisco, veloz como o vento
Versar como eu verso você bem queria!
Desculpe, menino, mas essa alegria
Só a idade vai poder lhe dar.
Atrás de ninguém nunca fui de andar
Na frente é que sigo, te dando poeira
Não sou tartaruga, não sou brincadeira
Cantando Galope, à beira do mar!
RIBEIRO
Do nó em pingo dágua, rasteira em cobra
Tartaruga veia, comigo no campo,
Vai me ver dá nó em ponta de relampo,
E abafa o trovão com o barulho da trova.
Antes que consiga no casco entrar,
Eu monto barraca e fico a cozinhar;
De barriga vazia, não tenho alegria,
Sua carne é dura, meus dente amacia
Fazendo um galope na beira do mar.
LEMOS
Você nordestino, Nordeste sem chuva,
Não encontra água na seca danada.
Como é que dá nó, seu cara amarrada,
Sem ter pingo dágua? É mão sem a luva!
Eu mando um recado pra sua viúva
Não chora, Sinhá Dona, cê vai encontrar
Um outro poeta pra você casar!
Pois esse já era, morreu com meu verso!
Chegou a hora dele, de ir pro Universo
Chorando um galope, na beira do mar!
RIBEIRO
Só pra começar, não sou nordestino,
E se eu falecer minha mulher põe luto
Pra nunca tirar, pois nenhum dissoluto
Tem calibre tal qual o meu, babuino.
É melhor cê tirar dessa boca de sino
O nome daquela que eu sei preservar
Te enfio goela abaixo esse novo cantar
Poeta de praia, eu não sô da tua laia,
Te meto nua saia, procê toma vaia,
Tentando um galope à beira do mar.
LEMOS
Poeta cê leia direito o meu verso
Falei com respeito à sua senhora.
Também sou casado e sei minha hora
E sou respeitoso com quem eu converso!
Só quis te mandar para outro Universo
Deixando uma pobre viúva a chorar.
Você entendeu mal o meu expressar
Mas eu nunca quis ofender a ninguém.
Desculpas, meu velho, quem deve a quem
Nesse bom galope, à beira do mar?
RIBEIRO
Cantador você não me vem dar lição
Que eu sou estudado e sei soletrar
Eu li os teus versos e pude notar
Que o moço e atrevido fazendo oração.
Te pus uma saia e agora um calção,
E pra que não fique a se lamentar
Minha ultima estrofe é pra te Louvar.
Seu perder um dia cantando ao teu lado
Eu saio com brilho, pois fui bem tratado
Trocando um galope á beira do mar.