Devaneios

Vou entrando por teus olhos

Em cada palavra lida

Pra ser parte de tua vida

Oferecendo-lhe os molhos

De rosas brancas em folhos

Onde exumo a alegria

Nas pálpebras da poesia

Dadas em salvas de prata

Que o meu ser todo retrata

Puro e pleno de alegria.

Mas às vezes a nostalgia

Me toma, feito um carrasco

E o meu corpo vira um frasco

Vazio sem serventia

Preso a essa fantasia

Eu sonho me libertar

Corro pro primeiro bar

Pra me entrego ao vinho

E voltar qual passarinho

Que aprendeu a voar.

Gotejam estrelas do olhar

Doce, igual já mais se viu

Sereno meu peito se despiu

Pra desnudo se revelar

Assim fico a sonhar

Banhado de neblinas mil

Caídas num mês de abril

Pra refrescar meu viver

Cálido de tanto prazer

Num céu eterno de anil.

O sol me parece gentil

Soltando por riba da serra

A chuva é amiga da terra

Mesmo no sertão hostil

Serei o seu filho servil

Devoto de sua grandeza

Lançando-me contra a dureza

De seus campos ressequidos

Pra jamais ser esquecidos

Os meus frutos sobre a mesa.

Se de um ser, a natureza

É aquilo que lhe define

Não peço que raciocine

Mas que tenhas a fineza

De aceitar a candideza

Do veiculo carnal

Sempre sujeito ao astral

Por sua vil formação

Preso nesta condição

Serei substancial.

Serei o essencial

Para a manifestação

Da significação

De um cetro natural

Um veículo terreal

Que suporte o abstrato

Ocupando sem contrato

Pra num ato ser deposto

Quando este ser, composto

Não mais lhe ser substrato.

Já que nasci sem contrato

Não viverei obrigado

Não sou certo nem errado

E por mais que me refrato

Não concebo o abstrato

Então vivo meu momento

Existindo a contento

Buscando aproveitar

Tudo que posso gozar

Até o falecimento.

Não quero aborrecimento

O futuro não existe

O passado não resiste

Nem me trás contentamento

No presente, reinvento

Nova forma de externar

Eterna enquanto durar

Toda a minha emoção

Vôo nessa sensação

Sem ter pressa de pousar.

Vejo a vida brotar

Das entranhas da mãe terra

Do meu âmago desterra

Um sentimento vulgar

Desejo de alcançar

O saber absoluto

Mas sendo eu dissoluto

Como vapor passageiro

Sou um broto do canteiro

Que se cobrira de luto.

Não perco mais um minuto

Tentando compreender

Se o ser ingênuo é bruto

Assim devo proceder

Já não me importa saber

Quais foram às primícias

Quero é provar as delicias

Gotejando dos pomares

Exalando pelos ares

O perfume das patrícias.

Perco-me em tuas caricias

Ébrio de amores sem fim

Passeando em teu jardim

Desdenhando das milícias

Desperto tuas malicias

Refugiando-me da dor

Aqueço-me em teu calor

Reascendo-me num instante

Transfigura-me o semblante

Na cor púrpura do amor.

Sou eu, teu desbravador

Aquele que te descobre

Nua, crua, cor de cobre

Nos braços do sedutor

E se me chamas de senhor

Não percebe o servo teu

O teu desejo é meu

O meu prazer eu lhe dou

Ávido como já estou

No fogo que se acendeu.

O nosso amor se verteu

Numa noite de luar

Onde um grilo a cricrilar

Em tiranas padeceu

Nosso êxtase varreu

Miríade incandescente

Choveu estrela cadente

Quais lágrimas do luar

Que o sol veio enxugar

Numa manhã florescente.

Tua boca, de tão quente

Marcaram o meu pescoço

Agarrando-me o dorso

Entregou-se loucamente

O meu coração pungente

Arfava na serração

Qual larva de um vulcão

Meu gozo então rompeu

Seu ventre estremeceu

No ápice do tesão.

Desfaleceste, então

Num sussurro suspiraste

Bendizendo o seu amante

Provocando a criação

Enchendo de excitação

Toda fauna e toda flora

Um sapinho, nessa hora

Acochou sua companheira

Logo a floresta inteira

Arfante se fez canora.

o teu corpo nessa hora

Transpirando de calor

Exalava o odor

De um sexo que evapora

Ao pouco a luz da aurora

Denunciou nosso crime

Mas a lua nos redime

Fazendo o dia calar

Em um eclipse solar

Onde seu fogo deprime.

Toda magia se imprime

Nessa cena tão romântica

Consolidando a semântica

Numa esteira de vime

O meu peito se exime

Da duvida é do medo

De revelar meu segredo

A uma deusa carnal

Numa área nupcial

Consolidei nosso enredo.

Ouvindo o passaredo

Num coro transcendental

Louvando a luz matinal

Nas copas do arvoredo

Assim eu lhe emparedo

Pintando uma obra prima

Enquanto teu olhar lagrima

Deslumbrado frente à tela

Retratando a transa bela

Que nossa união sublima.

Não há verso que exprima

A beleza dessa dança

Onde o corpo se lança

Faminto de baixo a cima

Não há palavra que rima

Nem que possa exprimir

O que nos faz exaurir

No néctar do desejo

A essência deste ensejo

Que nos faz evoluir.

Seleto neste existir

Eu volto a te procurar

Desejo me embriagar

Do mosto que faz fluir

O sumo do elixir

Que Deus não pode sorver

A substancia do teu ser

É algo que me completa

Tu és a forma repleta

Que trasborda meu prazer.

Cansado de tanto verter

Se contrai meu abdome

Percebo chegar a fome

Procuro me abastecer

Pra de novo me perder

E nessa contemplação

A massa que faz o pão

Esconde outro mistério

Substancia e alexetério

Que mata a fome do cão.

Depois de morto o grão

É no solo sepultado

Onde ele é despertado

Voltando a ressurreição

Dar-se à germinação

Reanima a semente

Que de modo comovente

De novo é fecundada

Recomeça a jornada

De outra forma vivente.

A chuva cai levemente

Sobre a terra ressequida

A semente adormecida

Sorve a água corrente

Se levanta o sol ardente

Pra dar a fermentação

Seu calor tem a função

De aquecer nova vida

A terra dando guarida

Garante sua gestação.

Rebenta o broto no chão

Muito frágil e delicado

O sereno é acionado

Com o orvalho do verão

O sol bravo da estação

Banha o novo rebento

Que se refresca com o vento

Sem ter pressa de crescer

Até um dia ele ser

Um arbusto a contento.

Se não for pra suprimento

Seu fruto não vai perder

Dele pode se fazer

Remédio e condimento

Basta ter discernimento

Para extrair o seu sumo

Fazer algo pra consumo

Daquele que necessita

É uma coisa esquisita

Mas isto é só um resumo.

As folhas sendo de fumo

Vira remédio caseiro

Recheio para o roceiro

Por na palha do consumo

Ou então vira estrumo

Para adubar a lavoura

A seiva desentesoura

Novas ervas e pomar

De esteio servirá

O pau pra fazer vassoura.

Dá pau para manjedoura

Ou dá esteio pra lenha

Seja a missão que tenha

Pra berço, pra varredoura

Ou pra toco que se agoura

Sempre tem utilidade

Quer no campo ou na cidade

É mantimento pro prato

Ou suprimento no mato

Basta criatividade.

Sendo sua faculdade

Própria pra alimentação

Se for trigo dá pra pão

Com muita facilidade

Basta ter habilidade

Pra fazer um banquete

De frutos e ramalhete

Com as flores pra enfeitar

A mesa para o jantar

Com um pouco de macete.

Dá pra fazer um cacete

Com o que brota do grão

Pau de cerca ou mourão

Até mesmo um palacete

Fazer banco, tamborete

Canoa, barco e navio

Bodoque para vadio

Colher e até gamela

Tamanco pra passarela

Cama pra colchão macio.

E pensar que esse fio

Começou de um caroço

De azeitona no almoço

Que me ascendeu o pavio

Sendo o homem sadio

Come tudo que poder

Saboreia como quer

O fruto que sai da terra

Quem planta no chão não erra

Vai colher o que ela der.

Depois de muito comer

Paro, pra fazer a sesta

O pensamento manifesta

E até o sono bater

Eu vejo o rio correr

E fico assim, divagando

Com os meus botões pensando:

“Porque que a vida é assim?!

Qual há de ser o seu fim??”

E assim vou me entregando.

Ávida vai me levando

Como um rio leva ao mar

Ela está em todo lugar

E no tempo vai rolando

Agora está ocupando

Este corpo racional

Mas está num animal

Que a degusta na planta

Onipresente ele encanta

Todos corpos do astral.

A vida é atemporal

Ela sempre segue em frente

Morrem os corpos viventes

Tendo inicio e final

Todo ser vivo é mortal

Está sujeito ao tempo

A vida em seu contratempo

Triunfará sobre o ser

Continuando a verter

Sem conhecer antetempo.

Ela está a destempo

E se mostra imutável

O ser, que é variável

Pra vida é um passatempo

Ela não conhece o tempo

De natureza imutável

A vida é sempre estável

O ser vivo é que perece

Sua estrutura padece

Dentro do tempo indomável.

Tudo isso é louvável

Pois a vida é uma só

Tudo que nasce do pó

É produto variável

Eu tento ser razoável

Vejo a biodiversidade

Mas no fundo de verdade

Somos seres diferentes

De uma vida, dependentes

Nisso ela mostra unidade.

Mostra impessoalidade

Abita o ser racional

Opera num vegetal

Não tem personalidade

Pensar é uma faculdade

Do ser que tem consciência

A vida, por excelência

Não sabe nem que existe

Apenas no que é persiste

Mecânica, sem exigência.

Ela não tem preferência

Não distingui bem do mal

Abita sempre total

O corpo em deficiência

Abita sem consciência

Sem fazer acepção

Um herói ou um ladrão

Gozam da mesma existência

Ela não tem preferência

Age sem acepção.

Se revela uma benção

Para todo ser vivente

E quem for inteligente

Desfruta com gratidão

Mas é uma maldição

Para o ser inconseqüente

Que anda incoerente

Semeando tempestade

Pra colher calamidade

Envergonhando a semente.

Falando abertamente

A vida pode ser bela

Dando sentido pra ela

Ela fica reluzente

Se mostra correspondente

Mesmo sem ter ciência

Emana benevolência

Conspirando a favor

Recompensando o labor

Em tudo tem coerência.

E bate a sonolência

Isso é coisa da vida

Cicatrizando a ferida

Nessa sua paciência

Eu sigo na preferência

Amando cada instante

Respeitando o semelhante

Como o meu complemento

Compartilhando o momento

Nesse palco radiante.

Depois de uma boa soneca

É hora de voltar pra lida

Os vivos cuidam da vida

Correndo atrás da merreca

Tem gente que até peca

Pois aos vivos tudo falta

E se for botar em pauta

Aos mortos tudo sobra

É necessário manobra

Pra bolsa ficar em alta.

O sol à tarde se exalta

E tosta a minha moleira

Ainda com uma lombeira

Minha mente é peralta

Eu sigo junto na malta

Cumprindo obrigação

No conselho, com o irmão

Vou campeando o gado

Junto à cerca do serrado

Que protege a criação.

Aboiando na função

Arrebanho, junto a tropa

Enquanto o sol galopa

Morno na imensidão

Faz-se um arrebol, então

Com andorinhas rasantes

E os passarinhos cantantes

Nas copas dos buritis

Tamanduás e quatis

Se destocam radiantes.

Na estrada os viajantes

Apeiam de seus cavalos

Gravetos fazem estalos

Nas roseiras flamejantes

São fogueiras radiantes

Onde a tropa se junta

E o mais velho assunta

Os anseios da família

Um menino faz quizília

Numa moda adjunja.

A neblina logo unta

A aba do meu chapéu

Estrelas dançam no céu

Sereno cai e besunta

A namorada pergunta

Se ainda é amada

O noivo foi pra jornada

E tarda em retornar

Enquanto ela a suspirar

Na janela apaixonada.

Em uma casa esquentada

Uma quenga bebe e dança

Desdita e sem esperança

Se entrega enfadada

A uma velha cantada

Expressa numa moeda

Sua moral se degreda

Vai o seu corpo vendido

Pra saciar um bandido

Que no leito a empareda.

Em sua entranha leveda

O sêmen que lhe traz nojo

Jamais verá o amojo

Amarga se embebeda

Sua vida é uma queda

Num poço frio e fundo

Sofre o rigor do mundo

Tentando se disfarçar

De rainha do lugar

Nos braços de um imundo.

O meu pensamento fecundo

Vagueia sem direção

E para na estação

Oscilante num segundo

Vejo um velho moribundo

Prestes a desfalecer

O padre já foi lhe ver

E cumprir obrigação

Concedeu extrema unção

Não há mais nada a fazer.

Contemplo o seu padecer

De ante da parentela

Uma fresta na janela

Lhe faz estremecer

O minguante a mover

Lentamente e tenebroso

Pois seu fim é desastroso

E ele tenta se acalmar

Vendo o genro desejar

Seu tesouro precioso.

O homem inescrupuloso

Sai à noite a procura

De levar a sepultura

O corpo de um esposo

Um jovem esperançoso

A de tombar na calada

Morto pela mão armada

De um maldito ladrão

Por causa da ambição

Outra viúva é deixada.

Cai o corpo na calçada

A maquina já não funciona

Não sente não se emociona

Não pensa e não diz nada

A alma está acabada

A matéria se apronta

E aos pouco se desmonta

Até vira puro sumo

Servindo então de insumo

Para se somar na ponta.

Um novo corpo se monta

No ventre de sua viúva

O ser novo se enluva

Outro corpo se confronta

Com o mistério que desponta

Incubado na entranha

É a vida que sempre ganha

Triunfando sobre o ser

Que um dia vai morrer

Viver é sua façanha.

A existência é estranha

Parece não ter sentido

O homem fica perdido

No senso que lhe apanha

A idéia se emaranha

É difícil definir

Mais fácil é se iludir

Com uma fé sem razão

É tanta complicação

Que não dá pra concluir.

A mulher se põe a parir

O seu filho desejado

Com dores por todo lado

E o ventre a contrair

Com anciã de exprimir

Geme a vida do ser

A criança vai nascer

Na noite de sexta feira

Nas mãos de uma parteira

Que sorri ao receber.

Um menino, sem saber

Brota lindo na videira

Sua sorte é perdedeira

Mas não pode compreender

É perfeito o seu ser

A ápice da criação

É dotado de razão

É pode raciocinar

Poderá se contemplar

E conhecer o irmão.

Dentre toda produção

É a expressão maior

Saberá dizer de cor

Toda sua emoção

Vivenciará então

Uma consciência plena

Está será sua pena

Perceber a existência

E entender com resistência

Que sua vida é pequena.

Perante o mundo encena

Um monologo teatral

Desde o dia do natal

Até a ultima cena

Durante a vida terrena

Tentará se distrair

Do que não pode fugir

De um destino cruel

Que amarga, feito fel

Na hora de despedir.

Ele tenta se iludir

Crendo na religião

Professa sua fé então

Procura se redimir

Da culpa de um existir

Que não sabe explicar

Ele quer se libertar

E viver eternamente

Se apegando loucamente

Procurando se salvar.

Não há como se safar

De um principio natural

Pois o ser atemporal

Tem no tempo o seu lugar

Não há como escapar

Conformar é o que lhe resta

O tempo é dono da festa

Ele é maior do que nós

Há de calar nossa voz

Nossos dias ele empresta.

Tem gente franzindo a testa

Não aceita a condição

Um já fez pauta com o cão

Beijando o que mais detesta

Vendo a avó pela fresta

O verme clama por Deus

Confessa os pecados seus

Com medo da sepultura

E de topar com a figura

Criada pelos judeus.

Outros dizem serem ateus

Procurando aniquilar

O que não podem alcançar

São só vermes, pigmeus

Tem quem se diz semideus

Tentando com persistência

Aprofundar na ciência

Clonando seres viventes

Iludindo seus parentes

Com sua incompetência.

Manipular a essência

Não é o mesmo que criar

A vida faz habitar

Corpos com deficiência

Ela não tem preferência

Isso é a lei da matéria

Não brinco com coisa séria

Não professo ateísmo

E também não pago dizimo

Mas não vivo na miséria.

Existe uma veia artéria

Um caminho a percorrer

E eu busco absorver

A energia da matéria

Sou uma simples bactéria

Com um notório poder

Eu consigo perceber

Que no mundo eu existo

E consigo ser bem quisto

Neste meu curto viver.

Através do nosso ser

A vida se movimenta

E de forma pachorrenta

Consegue se conhecer

Escute o que vou dizer

Eu conversando contigo

Você falando comigo

Somos uma avenida

Por onde uma só vida

Vai interagindo consigo.

Entenda isso amigo

A vida é uma só

Cada um de nós é um nó

De uma corda que bendigo

Em nós ela tem abrigo

Somos co-participantes

E por isso semelhantes

De uma mesma natureza

Onde se mostra a grandeza

Expressa em vários semblantes.

Somos como diamantes

Que o tempo vem lapidando

Nossos dias vão passando

Sob jugos tolerantes

Precisamos ser amantes

Da essência do existir

E deixar de agredir

O igual nesse caminho

Vamos tratar com carinho

E aprender discernir.

É possível coexistir

Dentro de um só canal

Água com doce e sal

Você pode decidir

Como há de prosseguir

Se o planeta amando

Ou o mundo odiando

Sendo amante do bem

Agirá como convém

E estará se resguardando.

Mas você pode também

Ser praticante do mal

E achar que é normal

Não ter respeito a ninguém

Até viver muito bem

Melhor que o homem bom

Mas eu não modero o tom

Para dizer que estás errado

Seu nome será manchado

Por má fama e não batom.

Da natureza o dom

De amar é coisa bela

Nossa vida é uma tela

Cheia de sabor e som

Temos nas mãos o guidom

Pra escolher a direção

Eu contemplo um clarão

O meu destino é incerto

Mas não quero passar perto

Do vale da escuridão.

E nesta contemplação

Agarro minha companheira

Vamos juntos a gafieira

Pra dançarmos um baião

Louvarmos a tradição

Depois votarmos ao lar

E unidos num abraçar

Fecundarmos outra vida

Uma criança querida

Que vai nos eternizar.

O mundo não vai parar

Se acaso eu morrer

Mas saudade há de ter

Quem neste mundo ficar

Pois eu vim pra exumar

No seio da geração

Um fiapo de paixão

Que uso para tecer

Nas agulhas do prazer

A minha nova canção.

Sei que a inspiração

É um dom da natureza

Existir é uma beleza

E nos traz satisfação

Bendito é o coração

Que no peito é pungente

Arfando alegremente

Satisfeito com a vida

Mesmo que arde a ferida

Sempre é bom estar presente.

Se meu corpo de repente

Se desmontar neste chão

Morto será qual um grão

Fecundo feito à semente

Ainda estarei presente

Na fôrma da esperança

E repleto nessa dança

Viverei ardentemente

Mesmo no corpo ausente

Existirei na lembrança.

Sei que já não sou criança

Mas não sou tão velho assim

Ainda espero de mim

Algo que só a fé alcança

Sigo nessa minha andança

Contemplando o semelhante

Desfigura meu semblante

Quando percebo a maldade

Que aprisiona a humanidade

Numa cela horripilante.

Busco achar um diamante

Algo que possa unir

E permita repartir

O melhor de cada estante

Vou seguindo adiante

Respeitando o estradar

Pois é preciso avançar

No caminho do amor

Ainda que cause dor

Devemos nos esforçar

Coisa linda é o lar

Sendo o esteio da família

É um porto, não uma ilha

Um reduto secular

É ela que faz girar

A dita saciedade

Eu falo, pois é verdade

A família é um elo

De um laço muito belo

Que envolve a humanidade.

O pai, a mãe e o filho

A base da construção

Que garante a evolução

Do refrão ao estribilho

Este cordão tem um brilho

No filho faz se fundir

Continuando a existir

Parte da mãe e do pai

Dessa forma a vida vai

O seu caminho seguir.

De todo ser que fluir

A vida em eminência

Só há de ter consciência

O fruto que a mãe parir

Precisamos garantir

Uma boa educação

Instruindo com atenção

Falando sempre a verdade

Pois a curiosidade

É um bem da criação.

Uma boa formação

De um caráter lustroso

É algo mui gracioso

Que requer dedicação

Responder a indagação

E os porquês de um menino

É um ato paladino

Feito com muito cuidado

Pra não instruir errado

E confundir o bambino.

Estimule o raciocino

Deixe a criança pensar

Espere ela te indagar

Não queira ser um rabino

Badalando feito sino

As respostas que quer dar

Antes dela perguntar

Não convém lhe responder

Há o tempo de fazer

E o tempo de esperar.

Ela há de questionar

No momento mais propicio

Quando a vida teve inicio

E é difícil de explicar

Não convém lhe afirmar

Que foi assim ou assado

Nada ainda está provado

É preciso ser prudente

Respondendo simplesmente:

O negócio é complicado.

Não é pra deixar de lado

Como quem foge do assunto

O melhor é pensar junto

Que o caso é delicado

Afirmar que foi criado

Pelo pai celestial

Pode parecer legal

Mas no fundo isso tudo

É pensar que o absurdo

Pode soar natural.

A vida é transcendental

Não pode ser alcançada

Se tudo saiu do nada

Afirmar é ilegal

Não há um ponto final

Portanto sempre direi

De pronto responderei

Se acaso quiser saber

O que eu tenho a lhe dizer

É simplesmente: não sei.

Confesso que já estudei

Mas não posso concluir

É difícil atingir

O que em vão perscrutei

Muitas vezes já errei

Por ser cheio de vaidade

Hoje, à bem da verdade

Aceito minha condição

E aproveito a estação

Dessa tal realidade.

Um dia a humanidade

Terá o conhecimento

Ou talvez discernimento

Um pouco de claridade

Digo com propriedade

Não sei porquê e nem como

Só sei que eu sou um gomo

Pois eu existo de fato

Sou da existência nato

Parte daquilo que eu somo.

Perguntou, eu não embromo

Quis saber, eu respondi

Me negou, eu não pedi

Amarrotou, desengomo

Se não me der, eu não tomo

Se não sei, eu não invento

Se tem cadeira, eu sento

Se não tem, eu fico em pé

Eu não desdenho da fé

Mas procuro o fundamento.

Vivo bem o meu momento

Aproveitando o mundo

Uns me chamam vagabundo

Outros notam o meu talento

Pra me dar contentamento

Tudo que quero me vem

A vida é um grande bem

Pensar é uma faculdade

Respeitar é humildade

Só agride quem não tem.

Agindo como convém

O pai dará bom exemplo

O seu lar será um templo

Seu filho será alguém

Querido por ser do bem

Cheio de graça e ternura

Bendita é a sepultura

Do justo e verdadeiro

Feliz é o brasileiro

Que estampa essa figura.

Se o vivo quer soltura

Louvemos a liberdade

Obremos com caridade

Emprestemos sem usura

Creio que ninguém atura

Tantos jugos desiguais

Se na lei somos iguais

Busquemos então cumprir

Deixemos, pois de bulir

Nos direitos dos rivais.

Os melhores cabedais

Não se compram com o dinheiro

A vida de um passageiro

É valiosa de mais

Os nossos bens naturais

Como o ar que respiramos

Seu valor não calculamos

Pois é um bem natural

Feito a água mineral

Que sem ver desperdiçamos.

Se ainda desprezamos

Uma moita de capim

Excluindo-a do jardim

Dela muito precisamos

Temos que cuidar dos ramos

Da fauna e toda flora

No tempo que é agora

Pra mais tarde não sofrer

O filho que vamos ter

Quando chegar sua hora.

O sábio não ignora

Que todo ser é finito

E eu sempre tenho dito

Por esta estrada a fora

Quem seu semelhante explora

Como fosse um parasita

A natureza irrita

E no tempo vem cobrar

Quem tudo quer ajuntar

Tem uma sorte desdita.

Coisa gostosa e bonita

É a solidariedade

Junto com a cumplicidade

Vira uma obra bendita

Mas a ganância maldita

Tem ferido muita gente

O povo anda descrente

De um futuro melhor

O trem vai ficar pior

Só não vê o presidente.

O homem inteligente

Sabe discernir o tempo

Perceber o contratempo

Do mal que vem pela frente

A natureza cadente

Geme e chora em seu lugar

Onde é que vamos parar

Com tanta má criação

Ferindo o próprio irmão

Pouco se pode esperar.

O planeta vai parar

Por falta de atenção

Sinto envelhecer o chão

Vejo o fruto falhar

Nova doença chegar

É crescente a violência

Sinto a impaciência

O ódio é a aflição

Cresce a indignação

Só o que vinga é a demência.

A falta de consciência

Governa o ambicioso

Que se sente majestoso

Obrando com imprudência

O mundo em decadência

Não percebe o seu fim

Em toda parte Caim

Se revela noutra face

Já não se usa disfarce

Quem vem pra roubar de mim.

Vou cantando mesmo assim

Minhas cantigas serenas

Faço novas cantilenas

Pra adornar o meu jardim

Ao justo eu digo sim

Ao ímpio eu digo nào

Ao pobre eu dou a mão

O rico peço um favor

Vê se escute o clamor

E ajude o seu irmão.

Juntos num só coração

Podemos chegar além

Falo pro seu próprio bem

Seja valente no amor

Mesmo que sofra a dor

De uma rejeição brutal

Saiba que é natural

Não ser por todos amado

Cristo já foi desprezado

Lá no seu torrão natal.

Despreze sempre o mal

Não ande no seu caminho

Seja flor, nunca um espinho

Jamais queira ser o tal

Pois isso não é legal

O bom é deixar saudade

Cultivar a humildade

Cumprir bem a obrigação

Promover a união

Buscando a fraternidade.

A a
Enviado por A a em 01/09/2006
Reeditado em 11/09/2006
Código do texto: T230221