Guarapó e Sarapuí

Ao Sr. Agenor Romagnolo

(7/9/1926 — 30/1/2010)

Quando vim di Santa Bárbara,

Fui batê — lá im Tatuí...

No começo foi u'a "barra"...

— Morá no Sarapuí!

Inda era um mulecote,

Mais já ‘stava bem disperto;

Num fiquei di cunvescote,

P’ra oiá o campo aberto.

A terra era bem vermêia...

E era boa p’ra prantá!...

Quem sabe, era’um pé-di-meia,

Pra’eu não ir mais istudá.

Na ‘scola tinha dessas coisa,

— Apanhá di parmatória...

Senão, ia pará na “loisa”...

E num tinha iscapatória!

Don’Aninha era marvada...

Dominava — toda a iscola...

P’ra insiná a tabuada... —

Dava a régua na cachola!

P’ra iscapá da professora...

Fiz u’a longa trajetória...

Mi ‘scondi junto às vassôra,

Pr’ofertá — jaculatória.

Apanhei di parmatória,

— Por tê ido na iscola...

Apanhá num era glória —

Foi mió prantá acerola!

Despois qui prantei acerola,

— Fui prantá abacaxi!...

Pensei inté prantá cebola,

P’ra vendê lá im Tatuí.

Mesmo qu’ela arda os zóio...

— Mió qui apanhá na mão!

Nos zóio — si ardê — eu móio...

Nas mão — vai ficá’um calão!

Meu pai foi no Guarapó,

Comprá terra pro meu irmão...

— Nóis fumo di palitó...,

Co'o dinhêro — já na mão.

Nóis ficô no Guarapó,

E era tudo o qu’eu queria;

Mais num quis prantá giló,

Porque dava muita azia.

Meu pai mi ajudô na roça,

Mi insinô a capiná;

Mais, fartava a tar carroça,

P’ra levá o capinzá.

A toicêra era gigante,

E fez calo im duas mão;

Nóis levô — tudo na ponte,

Num sobrô nada no chão!

Na fazenda do alemão,

Qui ficava doutro lado...

Só prantô pé di mamão,

Mais já tinha muito gado...

Ficou muito indignado,

E foi muito indelicado.

No galope acelerado...

Foi chamá seu agregado.

Ele veio dá um sermão,

Co’um jeito bem debochado,

Mais eu disse pro meu irmão,

Qui o alemão era fechado.

Nóis queimemo aquele mato,

P’ra ispantá as muriçoca...

Vi inté um gato-do-mato —

Corrê junto da palhoça.

Queimei toda aquela joça,

P’ra evitá mar-entendido...

Num sobrô u’a muriçoca,

P’ra zuní nos meu zovido.

Num demorô muito tempo...

— Era o rei do abacaxi!...

P'ra ficá no passatempo...

Brincava co'o macuxi.

Prantei u'a jabuticaba,

Qui era doce como quê...

Truxe lá di Sorocaba,

U'as semente p'ra vendê!

Foi co'a venda das semente,

Qui comprei meu caminhão...

Transportava muita gente,

P'ra ajudá na prantação!

Todo dia — ia no coreto...

Dava vorta im toda a praça;

E ficava bem discreto... —

Dan-duma di boa-praça.

Tive um Ford vinte e nove,

Mais só andava na cidade;

Nesse, eu num levava couve...

— Porque era u’a raridade!

Quando ia no cinema,

Ia todo perfumado...

Às vêiz, passava alfazema,

E ficava bem animado.

Conheci u'a italiana,

Bunita, qui nem mudelo...

Mais era u'a brasiliana,

E era lindo o seu cabelo...

Quando namorava a Serma,

Mi incontrava lá na Igreja;

Nóis ficava oiando as erva...

E as mor coruja-di-igreja!

Assim, qui casei co'a Serma,

Nóis tivemo a Madalena...

Gostava d'uma água terma...

— E já ouvia as cantilena.

Na época di São João,

Nóis fazia u’a grande festa,

E brincava co’os irmão... —

P’ra vê quar era a mó testa.

Fui no Banco do Brasí,

Pegá letra p'ra prantá...

Fiquei lá no peitorí —,

Ouvindo u'a muié cantá...

... E cantava tão afinada,

Qu'incantava a crientela;

Fora, aquela buzinada...

— Parecia u'a tarantela.

Foi prantando melancia,

Qui comprei minha fazenda;

Mais foi só burocracia... —

Demorei tê posto à venda!

Quando prantei melancia...

Deu um inorme vendavá;

Nunca vi u'a ventania... —

Qui pôis tudo p'ra daná!

Foi um forte vendavá...

E istragô toda a coieita;

Num sobrô nem o miará...

Só pudia sê "coisa" feita!

Deu u’a chuva tão violenta...

Qui foi lá nas profundeza;

— Nóis comia só pulenta,

E acabô nossa riqueza!...

Mais, o Banco dos inábil...

Se apossô da nossa terra...

Levô nóis — tudo no lábil,

Dizendo qui nóis já era!...

O Banco num quis sabê...

O qui tinha acontecido...

Mais queria, era vendê —

Pros colega, bem-nascido.

Quando dero a mar nutícia,

Eu 'stava na camarinha...

Dissero qui a tar pulícia —

Ia tirá — nóis da terrinha.

Foi u'a triste aceitação,

Intregá minha fazendinha...

Prantá, todo aquele chão,

— Só sobrô duas casinha!!

Ao oiá pr'aquele pasto...,

Só si ouvia u'a grande troça;

Dos "amigo", bem nefasto...

— Por ficá co'a minha roça!

Nóis devia lá pro Banco,

E não tinha o qui fazê;

Mais aos tranco e barranco,

— Pudemo sobrevivê!

— Agora sô apusentado!...

Já num ligo mais p'ra terra;

Eu só vim dá essi recado...

E dizê qui a história incerra!

Paulo Costa (Pacco)

Pacco
Enviado por Pacco em 27/04/2010
Reeditado em 21/07/2013
Código do texto: T2223096
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