Banalidade e revolta
Bailam no átrio mariposas e borboletas
Elas vieram reter sal e sangue dos corpos
mutilados pela guerra
Lá fora, na escuridão do firmamento
preenchido por estrelas mortas
Feras se fartam no amontoado de carne e carcaças
A miséria, racionalidade e importância do Homem é renegada.
O êxodo de almas paira sob restos mortais
dilacerados no interior das cidades e pradarias
E os corvos e abutres
Representantes do horror e da morte
Preenchendo céu e paisagem
Caçam as fontes de matéria e putrefação,
para saciedade da fome.
Ao longe, arrastando-se com a espada de cobre
ensanguentada e sem corte
O sobrevivente esquálido
Transfigurado profundamente no físico,
consciência e memória
Observa, com torpor e gravidade,
A extensão do cenário inanimado de corpos caídos
entre poças rasas de sangue e animais selvagens
Em seu extremo de sensações e ânsia,
Sem se importar com a sobrevivência
Rompe-se no ar o grito,
A reverberação do repúdio e vingança:
- Vedes, Donos do Poder, da Ordem e das Riquezas!
Nossos irmãos de espécie perecem como ratos na sarjeta!
Enquanto isso, nos palácios, templos e igrejas,
Vós, tuas gerações, proles e fidalgos
Vivem e se protegem as custas do povo
pobre, ingênuo e miserável!
Venhais aqui, neste campo de batalha
infindável e sem regras
Onde morrem mártires, pagãos, inocentes
e homens de toda Terra
Desde as origens da Babilônia,
Mesopotâmia, Alexandria e Tebas!
E vedes com os olhos da consciência,
O mar de átomos e corpos destroçados
pelos nossos próprios irmãos
e presente no organismo das feras
Não passamos de bípedes medíocres e presunçosos
que não honram a glória da racionalidade e inteligência.
Sem fôlego, padecendo pelo corte profundo
da lança entre o estômago e baço
O substituível herói despenca
frente ao chão enlameado
Virando a cabeça em busca de ar
Vê, antes do completo abismo da visão
e inexistência neste plano,
A aproximação dos animais famintos
com garras e presas estendidas
Prontos para devorar com indiferença,
um pedaço qualquer do que já foi humano.