GRATIDÃO

Ser in Dei Gratia

Agradecer a Deus é mais do que gesto — é respiração do espírito. É perceber que nascemos um dia não apenas como carne que chora, mas como promessa acesa no útero do tempo. Viemos ao mundo como quem escorre do infinito, pingando esperança nas mãos de quem nos acolheu com olhos de ternura e braços de abrigo.

Fomos, desde antes do ser, desejo de amor. Fomos afeição bordada no ventre de alguém que nos esperava como quem espera a chuva no deserto — não apenas por sede, mas por fé. Esse cordão que nos ligava ao corpo da mãe não se rompeu: virou raiz que bebe do céu, tornou-se fio invisível que nos ancora à origem. Porque a vida não começa: ela continua. E nós somos continuidade disfarçada de início.

O corpo é apenas uma casa provisória, feita de células que se reinventam, paredes que o tempo gasta, mas onde mora algo que não tem nome. Somos ciência, sim — tecidos, nervos, sinapses — mas também somos silêncio, poesia e sopro. Somos maré que pensa. Somos céu que pulsa dentro da pele.

Em cada gesto que cresce em nós, há um Deus que se dobra para nos olhar de dentro. Ele não nos moldou apenas com barro: Ele nos esculpiu com mistério. E deixou em cada canto da alma uma pergunta que nunca se cala: o que é ser?

E talvez ser seja isso: estar entre o mar e o céu, com os pés presos à terra e o coração vagando onde nenhuma ciência alcança. Ser é estranhar-se humano e ainda assim crer no divino que nos habita.

Porque não somos apenas algo. Somos o intervalo entre tudo. O ponto de interrogação escrito entre duas estrelas. A lágrima que o oceano não explicou. E a oração sublime que o vento levou para Deus.

Um dia, ao retornarmos ao ventre de Sua morada, na ressurreição de nossa história, não por merecimento, mas pela dádiva infinita de Seus olhos, receberemos essa essência que jamais enxerguei em mim.

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Samuel justino
Enviado por Samuel justino em 13/04/2025
Reeditado em 01/05/2025
Código do texto: T8308362
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