Partido
Ele tinha uma estaca apontada para o meu coração, e o que doeu não foi o sentimento de que eu poderia morrer, mas sim o de que ele não tinha coragem para me matar nem me deixar livre.
Meninas inferiores nunca podem se dar ao luxo de ter tudo o que querem, mas, de todo modo, elas nunca querem. Nunca desejaram ser iguais às superiores, mas pensam em como tudo poderia ser mais fácil. Meninas inferiores não aceitam elogios, como:
— Você é muito boa nisso.
— Você tem ótimo gosto.
Elas nunca se acham merecedoras. Em contrapartida, aceitam todo tipo de repreensão:
— Você precisa melhorar.
— Você errou.
— Não é assim que se faz.
Essas críticas as moldam, não existe nenhuma vantagem em si mesmas.
E então, um ser aparentemente superior aparece e fala tudo o que elas não aceitariam que falassem, mas, de tanto o ser insistir, elas aceitam e ficam felizes. As meninas inferiores não sabem, mas todo mundo quer, algum dia, mudar o pensamento sobre si próprio.
É como regar uma florzinha que parece morta e sem vida; a chuva rápida de verão a faz florescer, o que ajuda no momento, mas, se nenhuma outra chuva aparecer, ela morrerá novamente.
O ser superior some de tempos em tempos e sempre volta dizendo que a menina inferior é especial e única, que é onde ele encontra alguém verdadeiro em quem pode confiar.
A menina inferior se derrete como manteiga exposta ao sol grandioso, mas a noite sempre vem, e com ela o frio, a fazendo endurecer.
— Quem poderia declarar tantas coisas abertamente e com tanta facilidade? Sempre é mentira, sempre me enganam.
Mas, quem tem coragem de jogar fora a única coisa que te fez sentir, mesmo que por pouco tempo, melhor?
Era um verdadeiro limbo, um limbo visitado pelas meninas inferiores às vezes.
O ser superior carregava consigo uma estaca com palavras vazias, mas belas, e um martelo do tamanho da sua coragem em mentir.
A menina inferior não sabia ao certo: é melhor morrer ou viver com a dor de saber que nada daquilo é real?
Ela sempre estaria marcada com a culpa: eu poderia ter sido melhor.
Mesmo que a culpa não fosse dela.