Afinal, o que é afeto?
Quando a vida adulta exige resistência e resiliência enquanto esconde a criança revindicando atenção, o afeto se desdobra em colo para acolher essa queda tão iminente e oferece escuta àquela dor tão latente. Ele está aqui para abrigar essa dor e essa queda, até que você consiga seguir, apesar disso.
Quando a vida segue sendo a vida enquanto simplesmente não queremos vivê-la, o afeto se recolhe nesse escuro tão silencioso. Olhamos, juntas, para o nada, até que você consiga retomar seu movimento.
Afeto nem sempre precisa ser um movimento que movimenta o outro. A ideia de movimentar alguém, traduz-se, muitas vezes, num ato salvacionista da não compreensão da condição do outro. Salvar alguém, muitas vezes, apresenta-se naquilo que julgamos saudável para nós mesmos, mas que configura-se nocivo para o outro.
É, por exemplo, pedir à criança que engula o choro ao se deparar com suas primeiras frustrações ou ao jovem que permaneça naquele ambiente que o machuca ou ao adulto que continue em movimento mesmo ultrapassando seus limites. É uma tentativa falha de salvar o outro o mantendo num mundo que o adoece.
Cuidar do outro é permitir que ele sinta a frustração e a demonstre, é sentir as dores causadas pelo ambiente e entender o motivo dessa desistência, é observar quais limites foram ultrapassados e a necessidade daquela pausa.
Assim, também podemos afetar o outro quando o nada se faz presente. Ele é um movimento de acolhimento que se faz no recolhimento. "Posso te acompanhar nesse silêncio?", "posso te acompanhar nesse escuro?", "posso cair com você?", "Estou aqui com você."
O afeto em movimento não se faz apenas na fala, mas na escuta. Não sinto a sua dor, mas me disponho a senti-la para que ela não te sobrecarregue tanto.
O afeto em movimento não significa a ação sobre o outro, mas a pausa com o outro. Não precisa continuar agora, posso desacelerar meu movimento, me recolher com você e acolher o seu processo. Seguimos juntas no seu tempo e ritmo.
Afeto também é pausa e recolhimento. E a vida, na contramão do produtivismo, também se faz nas pausas e desistências.