Afinal, o que é afeto?

Quando a vida adulta exige resistência e resiliência enquanto esconde a criança revindicando atenção, o afeto se desdobra em colo para acolher essa queda tão iminente e oferece escuta àquela dor tão latente. Ele está aqui para abrigar essa dor e essa queda, até que você consiga seguir, apesar disso.

Quando a vida segue sendo a vida enquanto simplesmente não queremos vivê-la, o afeto se recolhe nesse escuro tão silencioso. Olhamos, juntas, para o nada, até que você consiga retomar seu movimento.

Afeto nem sempre precisa ser um movimento que movimenta o outro. A ideia de movimentar alguém, traduz-se, muitas vezes, num ato salvacionista da não compreensão da condição do outro. Salvar alguém, muitas vezes, apresenta-se naquilo que julgamos saudável para nós mesmos, mas que configura-se nocivo para o outro.

É, por exemplo, pedir à criança que engula o choro ao se deparar com suas primeiras frustrações ou ao jovem que permaneça naquele ambiente que o machuca ou ao adulto que continue em movimento mesmo ultrapassando seus limites. É uma tentativa falha de salvar o outro o mantendo num mundo que o adoece.

Cuidar do outro é permitir que ele sinta a frustração e a demonstre, é sentir as dores causadas pelo ambiente e entender o motivo dessa desistência, é observar quais limites foram ultrapassados e a necessidade daquela pausa.

Assim, também podemos afetar o outro quando o nada se faz presente. Ele é um movimento de acolhimento que se faz no recolhimento. "Posso te acompanhar nesse silêncio?", "posso te acompanhar nesse escuro?", "posso cair com você?", "Estou aqui com você."

O afeto em movimento não se faz apenas na fala, mas na escuta. Não sinto a sua dor, mas me disponho a senti-la para que ela não te sobrecarregue tanto.

O afeto em movimento não significa a ação sobre o outro, mas a pausa com o outro. Não precisa continuar agora, posso desacelerar meu movimento, me recolher com você e acolher o seu processo. Seguimos juntas no seu tempo e ritmo.

Afeto também é pausa e recolhimento. E a vida, na contramão do produtivismo, também se faz nas pausas e desistências.

maria paula da silva lima
Enviado por maria paula da silva lima em 15/02/2025
Reeditado em 28/03/2025
Código do texto: T8265527
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