Como de costume
Desço o morro costumeiro com passos barrulhentos e ligeiros,
Tendo as costas um incômodo de dor também rotineiro.
Nesta fria manhã de outubro que, quase ao meio, parece não querer desistir do inverno.
Estranho, se conto os dias
pra ver cessar esta rotina,
Que por anos a fio me mantém cativo,
Mesmo assim não me sinto culpado,
talvez só esteja de tudo um pouco cansado.
Vejo a menina que sempre vem da direita, aquela que tem os cabelos em mecha, pintados de doirado e várias vezes, usando uma blusa quadriculada, e há também aquela que desce do utilitário e toda vez acende um deselegante e nocivo cigarro, elas hoje não vieram a parada rápida.
Sinto-me órfão dos olhos ao sentir falta de uma situação que me era comum, o fato delas surgirem de repente e de maneira que eu penso ser egoísta enquanto estou irritado, não me incomodaria hoje, a atitude delas se lançarem ônibus acima a minha frente, abusando de seu género, visto eu ter chegado ali primeiro.
Tudo bem...
Da imagem turva que me reflete o sujo vidro da janela, não tenho dúvidas, me sinto tão mais velho, assim como o reflexo que vejo devolvido.
E neste momento me apego as lembranças que vão passando em minha mente, como a paisagem em movimento fora deste coletivo.
As boas memórias me trazem um certo prazer e incentivo,
das ruins busco o desapego permanente.
Enquanto caminho na chuva que é breve e quase não molha.
Prometi-me hoje o silêncio,
Não o silêncio dos oprimidos, dos que são impedidos de falar.
Nem tão pouco o silêncio dos que são cativos e assim são proibidos de se manifestar.
O meu silêncio será optativo e intencional, redentivo e reflexivo, agressivo e ruidoso, arrogante e ofensivo.
Se anunciará ao romper do dia, logo quando canta o galo.
Se confirmará ao findar do dia, desde quando põe- se o sol.
(Dói meu dedo obsceno, na articulação principal a proporção do avançar da idade e da minha indignação).