O luto
O luto tem sabor
Ele é amargo na boca
Não existe mel que possa combater
Trava a garganta destemperada
É congestionamento em tempo de chuva
Um temporal que embaça o para-brisa
É frio no calor, é suor sob a neve
É crescer em cubo de bronze
O luto é veneno
O tempo morre, a esperança sucumbe
Futuro sequestrado sem resgate
Divórcio da vida bandida
De que vale namorá-la, cortejá-la,
Se acabamos nos braços da morte?
Sem temer a violência que se esconde
Atraso o relógio em uma hora
É meia-noite, marco às onze
O luto é cinza, a cor
Dissonância, sem som, sem sabor
Cavalga as estrelas cadentes do abismo
Um espiral que se forma no Universo
O fim trava o tempo, arremeça os corpos
Os pés se negam a seguir e acompanhar
É viver um pesadelo profundo
Que implode sonhos e fantasias
É ver sem imaginar o blecaute do Sol
A queda da Lua, colisão dos cometas
Fuga inútil, mãos autofalantes, ruídos agonizantes