Falácia humana
A busca por aceitação de imagens vendidas tem afastado, metodicamente, o ser humano da consciência de si. A construção da sociedade, inevitavelmente, se pauta na edificação do sólido, prestigiando e até mesmo deificando complexos sistemas que gerem essa edificação. Nesse contexto, a reflexão — único instrumento de ligação entre o indivíduo e seu meio — é diabolizada por seu caráter subjetivo (seu próprio fim) e considerada inapta para a gestão e criação de "riquezas".
Dentre as matérias ligadas ao cuidado não corporal do homem, apenas a psiquiatria é elevada ao nível de ciência, devido à materialidade do binômio de sua aplicação: doença-remédio. O descuido com a "lógica" da existência tem gerado um crescente descolamento do indivíduo, tanto pessoal quanto socialmente. O desprezo pelo que é "o manual do usuário" tem levado o ser humano a se deixar guiar por definições externas, cada vez menos ligadas aos interesses pessoais e sociais. Uma sociedade baseada na exploração terá em seus guias uma liderança voltada exclusivamente para interesses mesquinhos, numa incoerente lógica de extração e acumulação.
Insuflado por uma mídia completamente derivada do sistema, a indução de hábitos e valores totalmente exógenos ao interesse e à compreensão humana tem feito o homem se perder em um labirinto, sempre levado por estímulos viscerais. A existência humana, com a imaterialidade de sua finitude, impõe um grau adicional de dificuldade — é difícil encontrar sentido para algo tão transitório e finito. Infortunadamente, como resposta e alternativa de solução, surgem "salvadores" que, prometendo alívio intelecto-espiritual, exploram a boa intenção de muitos. A venda de indulgências ainda é uma prática fervorosa em nossos dias.
A consciência da imaterialidade e da fugacidade da existência tem seu valor justamente na transitoriedade de nossos atos, que, sincrônicos e ajustados ao nosso mais atual estado de humor, são a única forma de se atingir o estado de equilíbrio, também conhecido como felicidade.