A ciranda do Amanhecer

Sob sentimentos e crenças que assombram...

Acreditar que o melhor da vida já passou é cessar o presente para viver de passado. A infância passou, seres valiosos passaram, paixões, sonhos, profundos encontros e momentos...passaram; permanecem as saudades e as memórias.

Viver com medo de perder quem (e o que) se ama, é saltar o presente e chegar no que pertence ao futuro. Antecipar os fins e trazer a sombra da morte para cobrir o que ainda vive é perder o tempo que existe para amar.

Surge a coreografia entre a Melancolia e o Medo: cheia de saltos, arrastos, algumas piruetas e fantasias, um tanto de paralisia e quedas finitas. Nela o espaço é distorcido, ora raso, ora abismo. É chamada de Dança da Morte, há valsas com os mortos e tangos com o Medo [da morte dos vivos], em alguns momentos tudo se junta em uma ciranda, círculos perfeitos e rodopios cegos que impedem outros de entrarem e quem já está dentro, fica tonto de tanto girar e nada encontrar.

No entanto, em todo amanhecer, nasce a pergunta: "Vai seguir com a vida ou vai ficar com os mortos e o medo?"/"Qual a sua escolha hoje?"; mas nem sempre há escuta ou uma nova escolha - "Amanhã. Amanhã faço diferente." - Então, quando o amanhã se torna o agora, já se está bebendo da mágoa e da água salgada do passado ou tragando o futuro. Ao habitar esses tempos, distante do presente, certezas são construídas: "o melhor já passou"- afinal, nessa porta estreita, tudo o que se enxerga já morreu e tudo o que pode chegar é a morte; assim se consome o ser e o existir, entregando-se para as memórias e fantasias, fechando-se para a vida e para o que ainda está.

O que acontece se seguir...se tomar uma nova decisão...se trilhar um caminho desconhecido...se escolher respirar os ares do presente? Como seria aceitar as perdas e tudo o que já passou? E se, aceitar a morte como certa, mas reconhecer o que está vivo - e vive - nesse tempo? Cria-se então, a possibilidade de entrarem seres, magia, de encontrar a vida - e o que pertence à ela. E mesmo que tudo seja diferente do que já foi um dia, mesmo que pareça não ter a mesma intensidade, profundidade ou beleza do passado; ainda assim irá valer, pois esse encontro com a vida, será também com o que já foi e com a força do que "foi muito". E se permitindo esse fluxo, honra-se o passado e os passageiros que vivem no coração (seja no amor com ou sem corpo/pelas existências que passarão ou já passaram), pois tudo o que passou torna-se parte do que é, da história e do ser que caminha no presente; e talvez, a forma mais profunda de gratidão, seja se permitir existir: ao se conectar ao que está, todas as Raízes - que são parte dessa árvore que é - se conectam também e tudo que faz parte de quem é, encontra destino nesse caminhar - e os que estão nesse caminhar, encontram o ser que existe.

Ao amanhecer, quando nascer a pergunta, qual será a resposta que dará? Vai seguir ou irá ficar?