GRITOS NA ESCURIDÃO
Por Davi Santos do Amaral – Escrito em torno de 1994 e 95.
O silêncio da noite e a neblina que agora cai sobre a cidade e eu aqui, ao relento, em desafino total com a humanidade, esquecido do tempo como um desocupado. Mas parece que nada consegue roubar a tranqüilidade deste momento que se iniciou na tardinha e já vai alta madrugada e eu ainda aqui, plantado feito um cão na corrente, escravizado por um prazer destruidor.
Talvez por ironia da vida aqui cheguei, ao estágio mais depravado da existência humana. Quantas vezes o destino abriu-me as portas para oportunidades exclusivas e eu, cego e ignorante, não percebi. Hoje remedio a minha dor com o mesmo veneno que aqui me trouxe, submergindo alucinado no lodaçal que agora me encontro. Os erros que tenho praticado alojam-se sobre meus ombros, fazendo peso sobre meu corpo e em minhas mãos uma seringa e uma colher (são) muito pesadas também, mas não consigo soltá-las.
Às vezes, uma luz no pensamento me diz que devo abandoná-las, mas (passa), porém, rápido como o vento, em frações de segundo. Olho novamente para minhas mãos e agora parece que estes instrumentos já se tornaram membros do meu corpo. Então a luz desiste e se apaga.
Meu futuro, eu sei, pode ser longo, mas muito insignificante. E não sei por que viver sem uma finalidade, um ideal... Parece que tudo isto é um grande pesadelo, onde corro sem sair do lugar.
Já não existe diferença entre o sol, a noite e a chuva, o dia, o mês e o ano. Tudo é igual a nada e nada mais existe no mundo além de mim aqui, nesta paz artificial, mas tão envolvente que talvez um dia destes eu ainda morra e não vá perceber, pois que isto tudo nada mais é que um inferno silencioso.
Preciso urgentemente que alguém tome uma atitude enérgica em meu favor, pois sei que sozinho jamais encontrarei força suficiente.
Davi do Amaral