Sombras e Pétalas

Quando a noite se cerra e o silêncio noturno se arrasta como um véu sufocante, as luzes fenecem, mas as sombras, impiedosas, continuam a rastejar pelos confins. A escuridão, espessa e inexorável, enlaça minha alma. É assombrosamente fácil afundar na miséria, quando a crueldade do mundo nos arrasta à descrença e ao amargo gozo do desalento.

Estremeço ao ponderar que as flores, frágeis em sua beleza, possam simbolizar algo além de sua efêmera existência. Mas não aquelas... as que já secaram e apodreceram. Meses se passaram desde que visitei aquele túmulo, um limiar entre as sombras e as flores. E ali, nesse crepúsculo, avistei a figura de uma flor — uma mulher de vestido alvo e sorriso esquivo, com olhos que brilhavam num jogo de doçura e ameaça. Ela repousou em minha alma, mas trouxe consigo uma tempestade de pesadelos.

Talvez ela não fosse inteiramente pérfida. O vestido, que se moldava ao seu corpo, parecia carregar uma pureza corrompida, e seus olhos, por mais brilhantes, não conseguiam comunicar a densidade de seus sentimentos. Mas a dor... a dor sussurrava implacável nas madrugadas, e pensamentos ácidos me arrastavam da paz para o abismo gélido de um medo breve, porém devastador.

A verdade, nua e inclemente, talvez seja que eu não era o protagonista desta farsa. Ou, quem sabe, era. Eu supunha que poderia desvendar a anomalia de sua existência, interpretá-la, ou ao menos decifrá-la na frieza da minha própria mente. No entanto, a angústia se prolongou.

Fugi. Daquilo que sempre me rondava, do temor mascarado de bravura, das circunstâncias que distorciam a realidade ante meus olhos. Nos meus delírios, vi bestas grotescas nas esquinas, devorando sua essência. E, por vezes, imaginei uma carruagem invisível que a levaria, sem deixar vestígio, num ato tão silencioso que eu jamais compreenderia.

Mas ela nunca escreveu. Não houve cartas. Não houve palavras de alívio que me dissessem para não me preocupar. Apenas o silêncio, opressor e inescapável.

Se eu tivesse compreendido meus medos, perceberia que ninguém, em nosso enredo, está imune. Tentei, ao longo dessa via-crúcis — com cacos cravados nos pés, relembrando-me a cada passo —, mostrar-lhe o lado luminoso da vida. Contudo, preso em minha desconfiança dessa horda — uma humanidade desfigurada, homens desprezíveis, mulheres ocos —, vi o caráter se desintegrar, corroído pela ganância e pelo desespero.

Talvez, se você houvesse compreendido, veria que nenhum ouro, nenhum homem, jamais poderia preencher o vazio entre nós. E, assim, entenderia por que, naquele dia fatídico, eu desisti de ser o pilar da sua vida.

Agora, diante de um gatilho insignificante, sem voz ou autoridade, sou apenas o foco de ressentimentos. O que antes foi tormento, ou luz, tornou-se apenas cinzas.

Dmitry Adramalech
Enviado por Dmitry Adramalech em 18/09/2024
Reeditado em 19/09/2024
Código do texto: T8154821
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