Devolvam-me!

todos eles levaram algo de mim

bilhetes, cartas bem elaboradas

fotografias, incensos

budas, xícaras

discos de vinil, camisetas

colares, sutiãs,

relógios, tênis, músicas,

quadros, perfumes, mandalas

Todos levaram algo de mim

Seja algo material como

Um dragão vermelho de duas cabeças

Ou superficiais

Como promessas ao pé do ouvido

Sempre fiz questão de marcar

A vida de quem cruza com a minha

Seja com algo,

Seja com um ato.

Eternizo uma porcentagem de mim

Uns até levaram

Minhas manias,

Minhas abreviações,

Meu sotaque,

Meus planos...

Às vezes penso no que perdi

Às vezes penso que me doei demais

Mas na maioria das vezes, penso:

Intensidade é um fardo, é ceder sem se arrepender

Então não me arrependo.

Sei que algumas cartas estão rasgadas

Alguns livros foram doados para algum sebo

Alguns discos se tornaram decoração

Algumas promessas foram esquecidas

E algumas músicas cantadas de forma errada

Mas de algo sou ciente,

Minha carência é inversa:

Sinto vontade de me doar

Sem necessidade de reciprocidade

Hoje não mais.

Cada um,

Levou um milésimo do meu coração

Em suas partidas

Mas o tempo

Cumpriu sua função,

Trouxe meus milésimos de volta

E levou consigo a nostalgia que eles me traziam.

28.08.2014