Ninguém te ensinou a engolir o choro?
Todo santo dia alguém me mata um pouco mais. Queria era poder morrer tudo de uma vez. Morrer aos poucos é penoso. Não é nem que doa, embora doa, a questão é que cansa. Espasmos persistentes mas es-pa-ça-dos numa dança maldita de estrebucha mas não morre. E eu querendo gritar, e o peito querendo explodir na voz dos desgraçados ao mesmo tempo que suplica a qualquer existência que seja poderosa o suficiente para lhe garantir um destino que se soubesse ser breve e discreto. Não estou interessada em ser imortal. Quero não. Que vida só é boa pra um ou outro.
Desse lado daqui verifico corações partidos aos montes e sem um ponto firme sequer que lhes garanta resistir dignamente ao próprio desmoronamento. Certeza única é a de que, independente da circunstância, o chicote do tempo estala apressando a gente toda que vai deixando caquinhos de corações pelo caminho. Ô lá, ficou pra trás mais um tiquim do meu! E o tic não espera um minutinho pra eu chorar, e o tac não tá nem aí pra como eu tô. Segue a marcha na ponte dos desesperados: com uma mão segura-se a dor, a outra desembaça a vista da brisa da estrada. Não sobrou nem mão pra acenar para o conhecido que passou com uma dor até bem parecida com a minha.
Me pergunto quem primeiro inventou de sofrer sozinho e porque ainda não apareceu uma alma que desinvente. Traz tua ferida pra perto da minha, deixa eu conhecer um jeito diferente de doer - meu olhar tentou falar. Não contei foi com a lágrima sorrateira que afogou a palavra que se agarrava na beirinha do olho. Estiquei a língua para aparar a palavra e senti o sal temperar meu paladar. Me distraí com o gosto que a palavra tem quando é engolida que nem dei fé quando o conhecido com a dor parecida desapareceu na multidão. Deixa estar, nasci com estômago forte e na barriga tenho espaço para acomodar discurso. Só não garanto que um dia eu não vá vomitar palavra por palavra