Palavras não ditas
Com frequência nós nos arrependemos daquilo que falamos. Seja porque ponderamos um pouco mais e, então, entendemos que foram palavras desnecessárias, seja porque o tempo passou e aquilo que foi falado nos parece, agora, completamente fora do tom. Fato é que podemos carregar conosco alguns arrependimentos pelas palavras lançadas ao vento. Palavras que, se for o caso, podem ser corrigidas na medida do possível. Isso porque podemos tornar ao nosso ouvinte, tentar esclarecer o nosso ponto e retroceder em nossas afirmações. Ou seja, quanto às palavras faladas talvez exista alguma chance de consertarmos a má eloquência, e, assim, concertar nosso erro.
Entretanto, não é sobre o que dizemos e sobre o qual nos arrependemos que quero conversar com você. Isso porque, como já entendemos até aqui, há chances de voltarmos atrás em nossas palavras (o que não quer dizer que isso é sempre possível). Quero falar sobre o outro lado da história. Sobre as palavras não ditas. Palavras que precisavam ser faladas. Palavras que mostrariam ao outro o que pensávamos a seu respeito. Palavras que talvez mudassem a forma como o outro nos via. Palavras que poderiam mudar todo o transcorrer de uma história. Mas perceba uma coisa. Se quanto às palavras lançadas existe a possibilidade de tentarmos consertá-las quando não foram bem articuladas, sobre as palavras não ditas não há nada que possamos fazer quando bate o arrependimento por as termos escondido. Isso porque nada foi expresso, nada foi demonstrado, não há nada a ser manejado, nada foi materializado ou concretizado. Quanto às palavras não ditas nada há a fazer quando nos arrependemos por não as termos declarado.
E geralmente o arrependimento só vem quando sentimos que, realmente, nada poderemos fazer sobre isso seja porque a pessoa a quem gostaríamos de dirigi-las já não está entre nós, seja porque as circunstâncias já não estão favoráveis para que o discurso seja bem recebido e cause o efeito que gostaríamos. E é bem fácil ilustrar essas questões. Talvez nos arrependamos por não termos compartilhado com um amigo querido o quanto ele era especial porque ele já não habita o mesmo mundo que o nosso. E talvez nos arrependamos por não termos declarado o nosso amor àquela pessoa querida porque hoje ela já se encontra no ápice da construção de sua família. E ficamos nos indagando e questionando. Como poderia ter sido se nosso melhor amigo soubesse que era amado por nós? Como poderia ter sido se aquela pessoa a quem amávamos (e talvez, embora em segredo, ainda amamos) tivesse consciência desse amor? Talvez nossas histórias fossem outras. Tudo poderia ser e estar diferente.
O arrependimento vem quando as palavras não ditas precisarão continuar não ditas.
Quais palavras você gostaria de dizer, mas que ainda não o foram?
Reflita um pouco sobre esse ponto sendo honesto consigo mesmo. Existe algo que queira dizer a alguém? Existe algum discurso que está todo completo na sua mente, mas que ainda não foi exposto àquelas pessoas as quais você gostaria de declarar o que sente? Não espere o amanhã. Nem espere ter coragem o bastante. Porque, como já cantava Renato Russo, o amanhã não existe. Você só tem o Agora, porque nem mesmo o Hoje lhe está garantido, afinal, pode acabar antes de completar as vinte e quatro horas. Agora é o momento. Apenas se lembre de estar confortável para anunciar aquelas palavras magicamente transformadoras. Mas se ainda não estiver, procure ficar. Não se apresse tanto. Nem se acomode demais. Coloque-se a caminho. Palavras não ditas, se jamais ditas, incomodam para sempre.
(Texto de Amilton Júnior - @c.d.vida)