Frustrar o mundo
Às vezes a opressão se apresenta de maneira profunda e amarga. E ela nem sempre surge do mundo à nossa volta, daqueles que nos cercam, mas de nosso próprio mundo interno, partem de nós mesmos e de uma busca incansável por uma perfeição ou por uma superioridade que não existem. Mas também partem de um sentimento de inadequação e insuficiência. Somos humanos, mas parece que nos esquecemos dessa condição na qual nos encontramos e absorvemos todas as expectativas, todas as demandas, tudo aquilo que lançam em nossa direção. Queremos agradar. Queremos acolher. Queremos fazer a diferença. Queremos que nos aceitem a partir da aceitação que oferecemos. Queremos que nos vejam a partir de nossos incansáveis esforços para que nos notem. Atolamo-nos de deverias e assumimos culpas sobre as quais não temos nenhuma ínfima porcentagem de responsabilidade. E, assim, afastamo-nos de nós mesmos e de nossas necessidades. Querendo ocupar um lugar no mundo, deixamos de ocupar um lugar em nossa própria história.
Você é apenas um ser humano. Você não vai dar conta de tudo o que esperam de você. E nem é obrigado a atender cada expectativa que lhe direcionam sem consultarem sua opinião sobre aquilo. Você não vai acertar sempre. Você, com certeza, irá errar muitas vezes, isso porque está aqui, como todos nós, pela primeira vez. E tudo o que é feito de primeira acarreta em uma sequência de erros que servem a algum propósito: aprendizado. Porque é errando, é insistindo em caminhos errados e cometendo equívocos ao escolher, que, então, começamos a entender a vida que queremos viver, retrocedemos, corrigimos nossos passos e temos a chance de fazer melhor. Então para que nos culpar ou condenar? Quem de nós possui um manual em mãos que assegure uma boa vida? É bem verdade que há diversos “sabichões” espalhados por aí querendo determinar o estilo de viver dos outros. Mas eles próprios estão desesperados em um mar de incertezas e, afim de aliviarem tal desconforto, quer que todos escolham como eles escolheram, pois, caso estejam errados, não errarão sozinhos.
Não. Não podemos colocar o mundo nas costas. Nem precisamos nos responsabilizar por sonhos que não sonhamos. Cabe a nós nos fortalecermos em nossa frágil condição humana para frustrarmos aqueles que tanto esperam de nós. Mesmo que sejam pessoas amadas e queridas. Mesmo que sejam pessoas especiais. Ou frustramos seus desejos que nos limitam ou vivemos nós mesmos em uma permanente frustração. E eu acredito que, com o tempo, os outros se acostumam com a ideia de que somos diferentes daquilo que imaginaram. Ou nós nos acostumamos com a ausência daqueles que não puderam nos aceitar e respeitar em nossa singularidade. Agora, escolhermos frustrar a nós mesmos é uma dor que custo acreditar que tenha algum ponto final: seremos para sempre o resultado daquilo que escolhemos. É melhor que sejamos felizes ainda que o mundo inteiro nos torça o nariz. É melhor que sejamos autênticos em um mundo de conformados que não se dão conta do conformismo ao qual se entregaram.
(Texto de Amilton Júnior - @c.d.vida)