19h51min
Aqui em Lençóis tem uns hostels (é assim que fala?) que abrigam pessoas em troca de “serviços por algumas horas”. Eles não aparentam se sentir mal. Há três semanas conheci uma mulher de Portugal que estava vivendo assim. A lindeza das mulheres de lá, é diferente. E ela sempre vinha ver minha gata, tomar café e conversar, sem maldade (eu acho… eu realmente NÃO SEI perceber essas coisas! =/ ). Não temos mais rancores com portugueses. A gente continua se maltratando sem precisar de ajuda desde muito tempo após vocês terem partido. Hoje dois homens entraram aqui, brasileiros. "Homens" eu digo: Rapazes. "Caras". Está desenhado nela e neles que são pessoas que não precisam apelar a esse tipo de morada, mas eles saem por aí se aventurando. Algumas pessoas fazem uma cara de nojinho olhando e dizendo: "Ficam pagando de pobres!”. É engraçado. Quando você se abdica de se comportar como um colonizador… O colonizado se irrita com você. Eu senti (quase senti) algo que veio até minha garganta de vontade de criticar a todos que entraram aqui, se hospedando em lugares assim mandando seus berços de ouro pro inferno. Foi então que parei em frente a Henrique. E conversamos… O ano era 2017.
– O que você pensa que está fazendo juntando esse mundo de livros aí?! E morando num quartinho?
– Eu sei lá! – Ele me disse. – Mas… ESTOU FAZENDO BEM MAIS DO QUE ESTAVA FAZENDO ONTEM. – Fiquei calado encarando ele. Ele não tinha cabelos brancos ainda, barbas brancas… reparei. Sorri com ternura. Ele tinha uma energia incrível.
– Você encheu uma mochila de 70 litros de livro e vai descer a ladeira??
– VOU! E você o que vai fazer hoje, amigo? – Ele não me reconhecia…
– Algo parecido.
Ele subiu. Nunca vi Henrique dando passos tão ligeiros. Em 2021 um homem de 80 anos parou ao meu lado. Eu estava desenhando gatos no meu caderno.
– O QUE É agora?!
– Você devia voltar a estudar…
– E quando foi que eu estudei?!
– Tá, tá, você devia estudar, QUERENDO, dessa vez.
– Acho que a gente devia parar de se ver.