Papel

Eu fui quando você deixou de viver.

Foi quando minhas forças acabaram.

Quando as palavras se esgotaram, depois de tanto explicar.

Depois de tudo tentar.

Anos sofrendo, chorando em silêncio.

Deprimido com a minha lealdade.

Questionando sua fidelidade.

Deixei de ser eu mesmo.

Deixei tudo o que eu era.

Olhei para fora e vi um outro mundo.

Quis testar até onde eu fugiria.

Quis fugir da realidade.

A fé se abalou.

A crença ruiu.

Fazer o correto me fazia mal.

Ninguém ligava desde que eu obedecesse.

Desde que fosse bom moço.

Do que adiantou o papel?

De que me adiantava esse céu?

Eu que não nasci para ser frio.

Que detesto o desdém.

Suas atitudes me fizeram fugir.

Foi então que parei de fingir.

Quis provar que o fruto da árvore me faria realmente morrer.

Quis provar se a morte não seria melhor do que viver a sofrer.

Tanto faz desde que seja atuação impecável.

Por falar em pecado, descobri que traição também é privar o outro da alegria de amar.

Mas isso não está no papel.

Depois de década sofrer, não me leve a mal.

A culpa é toda minha, mas por um dia eu fui normal.

Sofri como qualquer homem e deixei o manto da santidade enquanto me despia para um novo sentimento.

Quer saber? Funcionou e aplacou o sofrimento.

Poucos sabem a dor da solidão de estar só no papel. Sem vontade ou dever. Pra ficar bonito aos olhos de quem não merece.

Sofrimento da solidão consciente. Manter em algemas uma alma tão carente. De um menino que sonhava em se apaixonar. O homem que quase nunca viu alguém por ele enamorar. Não se lembrava do tempo em que se sentiu desejado. Não entende até hoje a maravilha do mundo em ser amado.

Não acreditar mais nesse conto. Alguém

o elogiar, provoca espanto. Não tem esperança de encontrar quem queria sua companhia. Morre um pouco a cada dia pensando nessa alegria.

Às vezes tem rima, as vezes tem agonia.

Decidiu-se voltar ao papel. Não ser cantor e nem poeta, quanto mais um profeta.

Não precisa de postura nem de holofote.

Precisa voltar ao papel e continuar a aparência de que é forte.

Poeta bobo
Enviado por Poeta bobo em 09/05/2024
Reeditado em 09/05/2024
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