Um detalhe obscuro de Bandeirantes/PR

Em 24 de março de 1964, uma terça-feira, toda a população da cidade de Bandeirantes (incluídos aí os moradores da porção rural, claro) afluiu às ruas para suplicar pelo Brasil. Eram então as vésperas do início do Regime Militar, e todos temiam a ameaça comunista. Os bandeirantenses foram alguns dos que mais pronta e sinceramente se fiaram à fé católica e publicamente fizeram a oração do Santo Rosário pela intercessão de Nossa Senhora Aparecida em hora tão calamitosa e incerta.

Tal gesto, ao mesmo tempo, uma mistura de simplicidade e ousadia, se converteria num ponto de inflexão para aquela cidade do interiorzão do Paraná. Logo após aquele memorável dia (que no calendário litúrgico anterior à reforma de 1969 era dedicado a São Gabriel Arcanjo) a cidade, que até então vivenciara um crescimento sólido, e mesmo notório - de repente, entrou em estagnação.

Parecia a muitos (senão à maioria, tanto habitantes como forasteiros) que Bandeirantes, por algum motivo não muito claro, havia "perdido o bonde da História". Da noite para o dia, todo o crescimento florescente que tanto alegrava a localidade, parecia ter chegado ao fim. A atividade agrícola declinou, as oportunidades de trabalho se reduziram, e pairava uma atmosfera de "não sei o quê" sobre a cidade que até então não havia. As pessoas simplesmente não tinham palavras para descrever ou explicar o novo estado de coisas algo indefinível.

Nos anos seguintes a 1964, um grande número de habitantes se mudou para outras paragens. Para citar um exemplo, uma parte desse êxodo foi o que contribuiu para o surgimento da cidade de Nova Bandeirantes, no Mato Grosso.

O desconforto que passou a ser sentido na cidade perdura até hoje. Alguns se voltam, saudosos, para os dias de antanho com bons olhos.

Entretanto, o que ocorreu em Bandeirantes a partir daquele maciço Rosário público só ganharia alguma clareza algumas décadas depois. Digo alguma clareza, porque aqui estamos mais no domínio da fé do que no da expectativas ou mesmo do planejamento humano.

Aquela grande demonstração de fidelidade dos bandeiranteses à verdadeira fé e, em especial, à Nossa Senhora Aparecida, fez com que a localidade fosse "reservada" por Deus. Ele a separou para Si. O Senhor não abandonou Bandeirantes - pelo contrário, Ele a preparou para a sua nova etapa. Como escreveu Santa Teresa, "amor se paga com amor". E sendo o amor de Deus bastante exigente, não é de se estranhar que envolvesse um período de deserto.

Hoje, Bandeirantes é a sede de um santuário dedicado a São Miguel Arcanjo, que atrai devotos de muitas partes do Brasil e do estrangeiro.

Foi construída uma réplica da Gruta de Nossa Senhora de Lourdes lá, e está sendo construída toda uma infraestrutura conexa ao santuário em vista do turismo religioso. Também no complexo do mencionado santuário foi erguida uma Cruz gigante, a maior ao ar livre no Brasil.

Concomitantemente a essa obra, a Igreja Matriz da cidade mais o Colégio Santa Isabel foram declarados como Santuário Diocesano de Santa Teresinha do Menino Jesus, que é a padroeira da cidade.

De cidade primordialmente agrícola, Bandeirantes se tornou pólo turístico religioso e também pólo universitário nas áreas de Agronomia e Enfermagem.

Quem poderia imaginar tudo isso naquele nebuloso ano de 1964?

Contudo, o mais chamativo dessa situação é que tanto o clero quanto as autoridades municipais ignoram totalmente o nexo de 24 de março de 1964 com a atualidade de Bandeirantes. Os comentários e perguntas que fiz a autoridades do lugar, imprensa incluída, tiveram como resposta "caras de paisagem" e silêncio. Sequer souberam me dizer se havia algum fotógrafo ali naquela terça-feira, ou se existe alguma foto da multidão orante que encheu as ruas naquela ocasião.

Não obstante essa flagrante esquisitice, não é de todo espantoso que tal seja o estado de coisas com relação ao Santo Rosário público de Bandeirantes às vésperas do Regime Militar. As nossas autoridades, comprometidas vergonhosamente com a agenda maçônica e progressista que avançou sobre o país nos anos 1960, fazem ocultação daquele memorável e autêntico acontecimento. Maçons e progressistas morrem de medo de Nossa Senhora - e têm ainda mais medo de gente muito unida à Mãe de Deus, por mais insignificante e pobre que seja a pessoa. Eles têm muito medo, não sabem lidar.

Que autoridades civis e de outras esferas ajam assim é lamentável, ainda que seja previsível. Todavia, que participe dessa ocultação vergonhosa também parte significativa do clero, além de lamentável, é inaceitável. Não é admissível esse tipo de postura dos homens de Deus levados ao Santo Sacramento da Ordem ou mesmo do Episcopado.

De quem é a culpa disso? Os graúdos de um e de outro segmento, por certo, se sabem do 24 de março de 1964 em Bandeirantes, ficam incomodados com o "teor direitista" daquela oração pública mariana; é bem provável que vejam naquele Santo Rosário algum "fascismo", "fundamentalismo", "extremismo" ou "alienação", como convém à nefasta heresia da Teologia da Libertação a que muitos homens públicos latinoamericanos se vinculam - eles nem ruborizam por provocarem a Deus e incorrer em Sua ira, que recai pesadamente sobre alguns tantos setores da vida nacional hoje em dia.

Tal má-vontade tem as suas consequências práticas em nível comezinho, do cotidiano das pessoas, mesmo as mais simples. Tornou-se tabu falar do Santo Rosário público em Bandeirantes em 1964. Mesmo em famílias católicas praticantes esse não é mais um tema normal de conversa. Aquele memorável dia praticamente caiu no esquecimento. Pouquíssimos são os que recordam aquele dia, e quase ninguém o menciona aos jovens e crianças. Eu, que não era nascido naquela época, e nem minha família paterna participou da ocasião, pois havia se mudado da cidade algum tempo antes, vim a saber dele por uma graça de Nossa Senhora.

Tomara, de coração, que haja um novo dia para as nossas soberbas autoridades e maus eclesiásticos; mas que venha com abundante graça de arrependimento e emenda do entendimento e do proceder.

O tempo passa e, inexoravelmente, o dia de hoje nos lembra que estamos um dia mais longe do início de nossas vidas, e um dia mais próximos do último dia de nossas vidas. Para uma multidão bastante grande, o dia 01 de janeiro de 2024 raiou com esplendor; para um número incontável (só Deus Nosso Senhor sabe com precisão) o dia 01 de janeiro de 2025 encontrará suas covas já com mato crescido...

Rafael Aparecido
Enviado por Rafael Aparecido em 11/04/2024
Reeditado em 13/04/2024
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