SENTIDO DA ALTERIDADE E COMUNHÃO
Um apego irrefletido a vida (como algo contínuo e sem rupturas) pode ser um sinal de alguém que não se arrisca a certeza do inevitável da morte ou desconsidera que suas ações obstinadas e ambiciosas podem ser fatais para si mesmo ao ferir a integridade de outro ser, nutrindo a ilusão de que só assim o seu ''eu'' pode se sobressair invulneravelmente. Muitos, dessa forma, se acovardam na consideração das mazelas de suas ânsias sempre insatisfeitas, em vez de dar lugar ao florescer da percepção da dor que nunca é somente sua: da dor que também emerge no semblante de outro ser vivo ou outro ser humano. Por outro lado, todo aquele que se abre à consciência de sua finitude, sabe dar um devido valor a cada instante vivido ao lado de seus entes queridos e às epifanias da vida que não servem jamais ao engrandecimento do ego narcísico, mas a extensão da compaixão que nos aproxima do outro e de nosso próprio ser em busca do divino-redentor. Ao sabermos que a nossa existência tem seu início e também o seu fim (enquanto nos aprofundamos em boas intuições e numa renovada consciência de si e do mundo), passamos então a enxergar a vida não como um gozo perpétuo e sem escrúpulos; ou como um espaço para atos inconsequentes e desprovidos da dimensão da alteridade e da solidariedade, mas como uma oportunidade para descobrir os sentidos no próprio âmbito da existência com todos os seus contrastes e ambivalências, seja num sinal de injustiça e sofrimento que nos conclama ao fazer algo sem qualquer imposição, seja no aprender a lidar com os lutos e as perdas inevitáveis (e, ainda assim, continuar nos mantendo firme em nossa autenticidade), seja em qualquer situação onde a nossa humanidade pode abraçar a vida na sua eternidade, sendo profundamente revelada na co-presença entre o eu e o tu: para a formação do nós em comunhão de paz, solidariedade e esperança.