A vida bem-sucedida
Temos vivido tempos de um individualismo preocupante. Mas observe bem, eu não disse tempos de individualização, ao contrário, disse tempos de individualismo. Porque a individualização nos faz pensar no sujeito que está se tornando um indivíduo, está desenvolvendo sua individualidade, fortalecendo a sua identidade, a maneira que terá para se colocar e se definir no mundo. O individualismo, no entanto, é apenas uma forma egoísta de cultuarmos a nós mesmos. E o individualismo nos faz perseguir uma ideia de autossuficiência inalcançável. O individualista quer conquistar tudo sozinho, quer dar conta de tudo sozinho e quer aplausos. O individualista não percebe, mas em sua soberba afasta as pessoas de si e perde o amor delas. Mas não apenas delas. Perde o amor próprio também. Porque não se permite errar nem tropeçar. Não se permite recomeçar. Não se permite cometer alguns equívocos porque está em busca de uma perfeição desumana. Enquanto a individualização nos permite ser quem somos – ou ao menos construir, de pouquinho em pouquinho, a resposta para a pergunta “quem é você?” –, o individualismo nos faz negar a nós mesmos, a buscar por um ideal no qual talvez nem acreditemos fielmente, mas que tentamos alcançar porque isso foi colocado como sinônimo para sucesso, para vida bem-sucedida.
O que é um erro.
A vida bem-sucedida é a vida que foi feliz e autenticamente vivida. Não é a vida perfeita. Não é a vida sem percalços ou dificuldades. Não é a vida na qual todos os sonhos se concretizaram e todos os êxitos foram conquistados. Nada disso. Até porque conquistas seguidas de conquistas de nada importam se tais conquistas não forem realmente algo no qual acreditamos. Então não. A vida bem-sucedida não é a vida apregoada pelo individualismo ao qual temos sucumbido. A vida bem-sucedida é aquela que descobrimos que queremos viver quando permitimos que a nossa individualidade se desenvolva e floresça. A vida bem-sucedida é a vida que nos permite dizer quem somos, é a vida que ao ser assistida por alguém o ajude a compreender quem estamos sendo.
A vida bem-sucedida é a vida que lhe dá um genuíno prazer.
Mas como descobrir que vida é essa se estamos tão embriagados por tantos discursos que nos fazem pensar que para a vida valer a pena precisamos ser os mais performáticos em tudo? Como descobrir onde encontrar essa vida se estamos distraídos demais nos deixando levar por falsas concepções do que é o êxito e do que é o sucesso? Como viver uma vida autenticamente feliz se em nosso individualismo cego passamos a perceber o mundo de uma maneira tão reduzida e limitada? Porque é isso o que o individualismo faz. Enquanto a individualização nos permite experimentar as possibilidades da existência, o individualismo nos faz acreditar que só há um caminho se quisermos uma vida realizada. O que é estranho. Que floresta pode ser assim chamada se nela houver apenas uma árvore? Que vida pode ser realmente feliz se nela existir apenas uma possibilidade? E quando tal possibilidade se tornar uma impossibilidade? Que vida restará?
Não se prenda aos discursos superficiais e inebriantes. Eles são sedutores porque prometem caminhos fáceis. Mas é tudo ilusão. A vida bem-sucedida é uma vida construída aos poucos, enfrentando obstáculos, desistindo de planos e dando prioridade a sonhos melhores. A vida bem-sucedida é a vida na qual temos o direito de reconhecer que nunca estamos prontos, ao contrário, estamos sempre nos fazendo e refazendo, porque a vida bem-sucedida não é a vida que acaba, não é a vida que termina, é a vida que continuará a acontecer enquanto continuarmos a respirar!
(Texto de @Amilton.Jnior)