Eu desejo a possibilidade, apenas
Para cada perda, torço para que exista a possibilidade. E que a possibilidade habite imediatamente a ponta dianteira do que se foi.
Eu desejo a permanência. Desejo que o abraço diga apenas sobre o breve amanhã e que o adeus retorne junto a volta do relógio. Desejo morar no calendário e abraçar o instante em que te amei, em que me refugiei, em que brinquei, em que cantei, em que dancei, em que sorri e estive com você.
Mas, de todas as possibilidades, não é possível ficar. Então eu desejo que fique a fotografia da saudade.
Eu desejo que nossos abraços sejam longos e que as despedidas sejam suficientes para o que não ficar. E desejo que tudo o que não ficar, se torne memórias completas para o resgate da saudade.
E que eu sempre tenha risos para resgatar. Que o vento me traga o seu abraço do ontem e o silêncio me acalente com sua voz. Que a potência do sol me lembre do que resta, após a noite me trazer sua ausência.
E então, eu desejo que a perda seja apenas o lado oposto da possibilidade, para que o vazio continue, em algum momento, a ser.
"Se pudesse desejar algo para mim, não desejaria riqueza nem poder, mas a paixão da possibilidade; desejaria apenas um olho que, eternamente jovem, ardesse de desejo de ver a possibilidade".
KIERKEGAARD, Der Augenblick [o instante]