Restaurador silêncio
O mundo anda barulhento. Ou melhor... Perdoem-me por minha inexperiência diante da vida e me permitam entender se o mundo sempre esteve barulhento. O que, sinceramente, acredito que sempre foi. Talvez a diferença nos dias de hoje seja que esse barulho anda potencializado. As redes sociais estão aí, poderosas, dando voz a quem não tinha e permitindo acesso a quem antes era privado. Então o barulho do mundo anda maior. Gente demais, como cantou Tiago Iorc, com tempo demais, falando demais, alto demais! E no meio dessa falação, por vezes sem sentido, estamos nós, lutando para ouvir a nós mesmos, ou desistentes dessa luta e simplesmente permitindo que as opiniões de um mundo tagarela sejam simples e puramente introjetadas por nós, sem uma crítica análise, sem uma profunda e necessária reflexão sobre o que faz sentido à nossa existência e o que simplesmente deveria ser ignorado, deixado de lado, jogado fora.
Fato é que muitos estão em sofrimento por conta do incessante barulho desse mundo ruidoso. O sofrimento é por não se ouvirem, não prestarem atenção em suas necessidades, não conseguirem ter um momento sequer compartilhando apenas da própria companhia. Andam distraídas. Ou buscam se distrair. Pois o silêncio da solidão nos deixa de frente com as nossas insatisfações e frustrações. É quando paramos para pensar que percebemos o quanto a vida não tem feito sentido nessa busca desenfreada por darmos atenção aos barulhos do mundo que nos cerca. Percebemos que estamos infelizes, mesmo seguindo a moda. Percebemos que estamos incompletos, mesmo lutando por seguir os padrões e colocar em prática aquelas palavras motivacionais que soam em nossos ouvidos enquanto nos dirigimos para o trabalho. Tais insatisfações poderiam ser encaradas de forma mais criativa se ousássemos silenciar o mundo. Porque o silêncio é mais do que necessário para a compreensão de uma conversa. O silêncio, no nosso caso, pressionados por tantos deverias, é restaurador!
“Quando não há silêncio, o som transforma-se em ruído e barulho, pois não há harmonia. A fala sem silêncio é tagarelice; as notas musicais sem silêncio não criam música, mas ruídos. Quando não há pausas, intervalos, não há ritmo, não há começos nem fins, e a experiência é infernal” (Beatriz Cardella)
Eis a razão de ser do silêncio! Oferecer harmonia. Fazer do som uma arte. Proporcionar experiências de leveza e compreensão! Precisamos de pausas, precisamos de descansos, precisamos de momentos nos quais tenhamos a chance de refletir sobre os passos que demos até aqui. Será que nossas vidas têm sido vividas no automático? Será que temos nos subordinado a ideias nas quais nem mesmo acreditamos? Será que não temos renunciado a quem somos em nome de um barulho que não nos permite ouvir nem a nós mesmos?
As pausas, os silêncios, os momentos de inércia servem para que vejamos as coisas por perspectivas ampliadas, livres das contaminações de um mundo tagarela, distantes de crenças e expectativas nas quais não acreditamos. Viver desenfreadamente, apenas obedecendo ao ritmo proposto, não é viver de verdade. Ao contrário. É desperdiçar a vida abrindo mão de nossa incômoda, ao mesmo tempo em que poderosa, liberdade de escolher. Mas parar de tempos em tempos para ouvir-nos é, além de restaurador, o único antídoto que vejo contra o marasmo de uma vida conformada: a vida que todos levam em detrimento da singular vida que poderíamos viver!
(Texto de @Amilton.Jnior)