É preciso se libertar

Às vezes, ou recorrentemente – a depender de nosso contexto existencial –, sentimo-nos insatisfeitos diante da nossa vida, perante algo que temos vivido e que gostaríamos que fosse diferente, que passasse por alguma transformação e que perdesse aquela sensação de peso e tédio. Muito disso se dá pelo automatismo com o qual atravessemos a estrada da vida. Pelo conformismo. Pela duvidosa crença de que as coisas serão diferentes naturalmente. Eis o nosso erro! Queremos a mudança, mas não queremos mudar; queremos a transformação, mas não queremos adentrar o doloroso processo de transformar a nós mesmos – um processo que pode ser, sim, incômodo, muito até, mas cujo resultado se resume em apenas uma palavra: liberdade!

“Se você quer voar, tem que largar aquilo que te puxa para baixo” (Toni Morrison)

E esse processo é incômodo porque nos faz entender uma coisa que tentamos ocultar de nossos olhos a todo custo, a fim de nos isentarmos de nossa responsabilidade diante da nossa vida: queremos o novo, mas recusamo-nos a soltar o velho; queremos as novidades, mas não queremos abrir mão do costumeiro; queremos voar, mas não queremos nos soltar de nossas cadeias. E não queremos nos soltar porque, talvez, a prisão esteja sendo confortável: dirigindo aos outros, a alguém, ou a algo, a responsabilidade pela transformação que pretendo viver, livro-me do fato de que sou autor da minha história e, assim sendo, sou aquele que determina meus fracassos, meus erros e meus equívocos, embora também seja aquele que poderá me encaminhar aos meus acertos, sucessos e conquistas. A vida é arriscada, eu sei. E assumir a direção nos angustia pela responsabilidade que tal liberdade nos delega. Mas é bem melhor do que ficar preso por uma versão de você que talvez já nem exista.

Quando entendemos que temos sido nós mesmos os nossos maiores carcereiros, pode ser angustiante. Na verdade é angustiante. E até revoltante. “Como fomos capazes de nos aprisionar dessa maneira?” Podemos bradar. Mas é importante que reconheçamos que até o desconforto aparecer, até o sofrimento surgir devido a uma insatisfação existencial, estivemos nos sentindo seguros em meio àquelas coisas que nos aprisionavam e limitavam. Elas fizeram sentido por algum momento. E temos a tendência de desejar que tudo o que fez sentido um dia faça sentido eternamente. Não que estejamos condenados à efemeridade e que, portanto, tudo o que temos hoje deverá, necessariamente, um dia partir. Esse é um pensamento desesperadamente equivocado. Mas o fato é que as coisas têm uma probabilidade de, em algum momento, deixarem de ser o que um dia foram, seja porque mudaram ou porque nós mudamos. O problema é quando não aceitamos isso, que a vida muda e que precisamos mudar com ela... Que sua vontade de voar seja maior que o medo de assumir a responsabilidade pela liberdade do próprio voo!

(Texto de @Amilton.Jnior)