Saudades de Jacy
Uma saudade de mim, de minha voz ativa chamando meu nome e sussurrando palavras doces aos meus ouvidos. Palavras essas que despertam vontades, desejos secretos e indiscretos. Aqueles que aguçam a imaginação e põem em ponto de ebulição o meu instinto mais oculto. Só eu sei o que preciso, o que me falta e me completa.
Comigo, eu posso ser verdadeira, falar o que penso, o que julgo ser certo ou errado e nunca irei discordar de mim, pois me permito uma liberdade sem condições. Quando traço uma linha temporal, imagino momentos de qualidade que tive ouvindo uma música, lendo um livro, compartilhando conhecimento, aprendendo a crescer, e o que dizer de minha infância e/ou juventude?
Foram momentos únicos, todos são, mas aqueles serão inesquecíveis. Uma inocência intocável, e o despertar para a vida real trouxe traumas não tratáveis. Conhecer o outro não é um ofício para amadores, exige uma visão além do alcance, pois cada indivíduo se mostra de acordo com as conveniências e ocupação na estratificação social.
Por isso, não vejo a lateralidade como extensão de minhas prioridades. O que importa sou eu. É de mim que estou falando. Sinto falta de mim. De ter mais voz ativa. De me posicionar sempre que possível. De dizer mais nãos e menos sim. Sinto falta de não concordar. Sinto raiva de obedecer por obedecer, sem lógica e sem proporção.
São tantos desafios nesse mundo cão que questiono o livre arbítrio e a liberdade de expressão. São metáforas e licença poética de algum escritor; só pode ser. Comigo não tem erro, não vivo em vão. Ficar só, não é fotografia de solidão, é opção . Sei que a interação social faz parte do ser de natureza gregária, e na condição de humana represento muito bem.
Entretanto, não sinto que o meu sorriso bobo e debochado precisa de uma alma gêmea (risos), e que o meu estado de espírito se manifeste através de uma entidade ou divindade. Minha felicidade é algo muito particular, subjetivo e intransferível. Ninguém pode me completar, mesmo porque não sou uma lacuna ou um vão. Certo, o meu jeito não dá para prever e vive dando defeito, e quem não?
Amo esse meu lado improvável, imperfeito e inveterado. Pelo visto, não fujo da definição de animal racional. Falar aleatoriamente, de vez em quando, é aceitável, agora, o encadeamento lógico, a razão e o pensamento crítico é basilar. Sou uma bomba de efeito retardado. Primeiro, penso sobre toda a situação e analiso os riscos. Depois, desconstruo os achismos, faço um paralelo e tomo uma decisão.
Uma atitude imediata pode fragilizar-me. Não é saudável ter reações automáticas. De fato, algumas pessoas despertam o meu lado menos atraente e num dado momento: Boom! Normal. É o que os humanos fazem, reagem. Não gosto de conduzir minhas ações pela boca dos outros. Gosto de uma avaliação clínica e cirúrgica, nada de parto auditivo ou diarreia oral.
E como um ser pensante, identitário e referencial, amo meu jeito de ser. Tenho saudades de mim, toda vez que não posso ser eu mesma. (Jaciara Dias)