O Dharma

Acredito que o conforto de acreditar em uma forma de destino alivia o vazio de nossos corações. Acreditar que existe um sentido, uma vontade, algo além de um nada cósmico gigantesco. Algumas vezes a segurança de que temos um propósito é tão grande que até acreditamos realmente tê-lo. Explica as ligações do destino, os medos, as intuições, as paixões inexplicáveis, as lições dolorosas.

E este cordão gigantesco, passando por cada pequena conta desse universo, formando um desenho abstrato de ligações e relações, carrega cada um de nós como uma corrente fluvial. Cada instinto, cada impulso, cada desejo estranho, tudo é uma manifestação do chamado Dharma.

Basta da ignorância. Não falo aqui de uma percepção mística e espiritual sobre prever o próprio futuro, falo sobre observar nossa própria vida e perceber o impacto que temos nas vidas de nossos companheiros, na proteção de nosso coletivo, na preservação dos sentimentos e no cuidado com a manifestação ao nosso redor. Falo sobre ter consciência do papel que se tem por completo, e levá-lo até o fim.

Dharmas não são apenas linhas individuais. Eles se cruzam. E se um dos lados não cumpre seu papel, não ouve seu instinto, não reflete sobre quem é, ambos os envolvidos tem seu fluxo rompido, e em pequenos grãos de poeira, um pouco de sua própria existência vai embora. Quebrar o Dharma é um erro. Ter o Dharma quebrado é um abandono.

Mas há recompensa pelo esforço, estar preparado para uma emergência. Se teu herói te abandona à morte ou à loucura, salve-se você mesmo. “Seja por amor as causas perdidas”, disse o poeta. Se o que resta é o fim, a falta de sentido, o vazio eterno, arranque a si mesmo de dentro e si e perceba, perceba a beleza da existência ao seu redor, a beleza deste universo condenado, de entes perdidos, procurando sua luz.

Há aqueles que fugiram por medo, por raiva, por desprezo. Há aqueles que clamam nem saber que havia algo a ser feito. Mas o Dharma não se importa com desculpas, apenas com deveres. Venho pagando karmas por não ter pedido ajuda alto o bastante, condenado a esperar em silencio uma ajuda que não virá. Me pergunto se meu suposto salvador sente algo ou se o esforço que fiz para inocentá-lo o poupou.

Não mais protegerei ninguém do Karma. Tenho minha própria vida pra viver, e me resta dedicar-me ao meu Dharma por completo. Aos que passaram, arrancando partículas de poeira, não desejo mal nenhum, nem mesmo o bem. Desejo força e sorte. Que sigam seus papeis sempre, sem medo, e cresçam, por si mesmos. Nos vemos quando os cordões se cruzarem, se estiveres com coragem.

Ariel Alves
Enviado por Ariel Alves em 14/06/2023
Código do texto: T7813496
Classificação de conteúdo: seguro