O caminho para ver o sol
Aceite segurar na minha mão e venha comigo para o meio da floresta. As criaturas que lá vivem podem causar medo, podem te fazer sentir que devia correr dali, que com certeza algo de muito ruim acontecerá no próximo segundo, mas isso é só porque você ainda enxerga tudo no escuro, como se lá dentro fosse noite o tempo todo.
Todos aqueles seres assustam, são selvagens e imprevisíveis. Afrontam quando você se aproxima e correm antes que recebam alguma reação. Se escondem e desaparecem, mas só para te desarmar e te atacar quando você esquecer do perigo que representam.
Esses bichos nunca andam só, nunca te deixam só. Estão sempre em bando vigiando seus passos, como se o tempo todo pudessem puxar seus pés. Parecem sempre perdidos e disformes, quase como o resultado de uma experiência malfeita, não possuem objetivo certo, aparentam só querer te desestabilizar.
Mas agora eu seguro sua mão e te faço caminhar para a parte mais densa da floresta, para a parte mais cheia destes animais. Te faço andar, mesmo que relutante e assim avançamos lentamente. Cuidado, não pise naquele galho porque se ele fizer barulho seus medos vão acordar.
Feche os olhos agora e se concentre em mim. Siga o som da minha voz. Eu quero que conheça uma nova criatura. Uma que você nunca viu, mas que só vive nesta parte mais fechada. Quero que sinta o pelo macio nos seus dedos, que deixe os sons existirem em outro mundo e fique apenas com o conforto da respiração deste novo ser. Você tem medo? Eu sei que não. Pela primeira vez, não tem medo.
Abra os olhos, mas não se assuste. Eu sei que nunca antes te havia aparecido algo tão belo e seguro no meio da mata. Este ser parece ter luz própria, te faz ver com clareza. Pergunte se está sozinho e ele te mostrará um par de olhos sedentos que te observam escondidos em uma parte escura e assustadora. Deixe que a luz dele vá na frente e quando chegar onde aquele par de olhos mortais está, você verá que aquela criatura disforme também tem sua beleza e paz.
Num segundo toda floresta parece começar a amanhecer, veja agora todas estas novas criaturas, todas tão belas, todas tão seguras. Será que agora você já pode ver o que seus medos e assombrações realmente são? Converse com eles, escute o que podem ter a te ensinar. Sinta o que é real e fique com a segurança de que está tudo bem, que não existem criaturas disformes prontas para te atacar, e que nada puxará seus pés sem aviso.
E, agora que você consegue enxergar sem esconder seus olhos da verdade, sem precisar de um manto escuro que te enlouquece, agora que você sabe que a parte mais densa da floresta nada mais é que uma campina onde você pode ver o sol nascer, não se preocupe em saber em que momento soltou minha mão, nem se isso foi pouco antes de eu desaparecer, e nunca se questione se um dia eu voltarei, porque agora você já não precisa de mim. Agora você já pode aproveitar a vista do amanhecer, e, mesmo quando anoitecer de novo, você já sabe o caminho para ver o sol novamente.