Hospitalidade

A leitura é capaz de nos proporcionar um crescimento que poucas experiências na vida seriam capazes de oferecer. Um crescimento interior. Uma mudança de compreensão sobre a vida. Uma transformação na forma como encaramos a realidade ao nosso entorno. E uma dessas leituras transformadoras na minha vida se trata do livro “Por que amamos?”, de Renato Noguera, que fala sobre amor a partir de conhecimentos mitológicos e filosóficos. Eu poderia escrever muitas coisas sobre esse livro, mas quero me atentar a que mais me chamou a atenção e que espero que sirva de incentivo para que você também se delicie com as páginas dessa bela e esclarecedora obra!

Na vida há um senso comum que diz mais ou menos assim: “Faça aos outros o que gostaria que fizessem com você”. Em seu livro, Renato nos alerta que a reciprocidade dentro de nossas relações é uma coisa importante, afinal de contas, quem ama quer receber de volta o amor, quer ser amado. No entanto, o autor esclarece que quando se trata de amor, de relações amorosas, a reciprocidade não é o bastante, não é o suficiente, não dá conta do recado. No amor, conforme explicita o autor trazendo conceitos de outros estudiosos, é importante que haja hospitalidade, portanto, tratar a pessoa como ela gostaria de ser tratada!

É uma profunda mudança de paradigma que eu gostaria que você observasse nesse momento.

Porque vivemos muito em função de nós mesmos. Então talvez nos faça sentido a máxima de fazer aos outros o que gostaríamos que fosse feito a nós. Então se queremos respeito, que respeitemos; se queremos ajuda, que ajudemos; se queremos amizades, que sejamos amigos. Se estivermos falando de relacionamentos de amizade e coleguismo, como aqueles que temos com nossos vizinhos ou companheiras de trabalho, por exemplo, tratá-los como gostaríamos de ser tratados pode ser uma bela maneira de impulsionar harmonia no seio de tais convivências. Mas quando falamos sobre relacionamentos amorosos, que exigem cuidado maior, cuja convivência é muito mais íntima e intensa, tratar nosso parceiro ou nossa parceira como nós gostaríamos de ser tratados por ele pode não fazer sentido. Porque talvez nós gostemos de receber café na cama pela manhã, só para citar um exemplo simples, no entanto o outro, ao acordar, só quer saber de tomar um belo banho que o ajude a despertar antes de qualquer coisa. Então dar a ele um café na cama só porque é o que gostaríamos de receber pode não ser uma ideia brilhante e acabar causando desentendimentos antes mesmo das nove da manhã.

Pensemos em hóspedes que recebemos na nossa casa. Familiares distantes que vieram passar alguns dias conosco. Talvez nós gostemos de tomar café no copo, de comer com colher e dormir com três travesseiros. No entanto, não impomos nossa forma de viver às visitas. Pelo contrário. Na hora do café perguntamos se preferem copo ou xícara. Na hora do almoço, oferecemos garfos, facas e colheres. E na hora de dormir perguntamos quantos travesseiros podem lhes deixar confortáveis. Porque isso é ser hospitaleiro. Isso é exercer a hospitalidade em relação àqueles que, de tão longe, vieram nos visitar. Queremos que se sintam bem. Portanto, os tratamos como querem ser tratados, como dizem que lhes deixará confortáveis.

É assim que deve ser no amor, quando olhamos para o nosso companheiro ou a nossa companheira, aquela pessoa que tanto amamos e queremos manter por perto. Precisamos ser hospitaleiros. Ao invés de tirar conclusões a partir de nós mesmos, dos nossos gostos e das nossas vontades, devemos nos inteirar sobre como aquela pessoa se sente confortável diante da vida e, então, fazer a ela o que ela gostaria que lhe fosse feito. Para isso vamos precisar superar o nosso egocentrismo, a forma centrada em nós mesmos que temos de ver a vida, para perguntar ao outro o que lhe agrada, o que lhe faz feliz, o que lhe proporcionaria a sensação de bem-estar e conforto. E, a partir dessas coisas, fazer o que nos for possível, aquilo que somos capazes, para que o amor de nossas vidas se sinta realmente importante para nós.

Quando falamos de amor, então, reciprocidade é importante, mas hospitalidade é fundamental. Que os diálogos aconteçam e, assim, que floresçam os amores que plantamos por aí!

(Texto de @Amilton.Jnior)