O Pensamento é uma Forma de Arte

I – Pensamento como arte

“Que temos em comum com o botão de rosa, que estremece porque sobre o seu

corpo há uma gota de orvalho”?

É verdade: amamos a vida não por estarmos habituados à vida, mas ao amor.

Há sempre alguma loucura no amor. Mas também há sempre alguma razão na

loucura.” - Do ler e escrever: Assim falou Zaratustra.

O pensamento é uma forma de arte. Apenas tem valor como arte e sua valoração só é possível enquanto arte. O anseio pela busca da verdade por parte do filósofo é uma máscara que omite seu real interesse: “criar uma obra mais duradoura que o bronze”. O sistema de pensamento criado pelo filosofo é esta obra, que pretende ser a arte que o eternizará em bronze.

Mas o próprio filósofo não se apercebe de seu real interesse, porque reage a uma vontade mais forte que ele mesmo, sendo, essa própria vontade, ele mesmo, que faz parte de um impulso a orientar tudo que há ou existe universo, cuja ação busca alcançar mais de si mesmo no espaço e no tempo, através dos influxos da vida e da morte, eternamente, em toda e por toda galáxia; respondendo a uma (in)razão de energia que busca incessantemente se expandir, dominando, no percurso, outras formas de energia, as quais, iguais a si mesmas, também vagam pelo cosmos totalmente cegas e inexoravelmente sem sentido. Razão, Consciência, Vontade, e Eu - são senão instrumentos dessa vontade dominadora, que move e manuseia a ação do homem. O pobre homem, encarcerado num mundo incomensuravelmente grande e em constante expansão, jogado no abismo de sua pequena existência diante de uma implacável imensidão, viu-se obrigado a justificar sua própria razão de ser, e, com esse intuito, inventou os instrumentos de pensamento, bem como suas palavras grandiloquentes, como justiça, ética, moralidade, democracia, igualdade, direito, ancorando-se na possibilidade que ao descobrir esses conceitos no mundo, por conseguinte, descobria também a prova irrefutável de sua origem divina, fruto da capacidade de sua alma, presente máximo de um criador, bondoso e paterno, ser supremo cuja própria existência embasaria seus ideais supremos, e ao fato de existir algo no lugar do nada. No entanto, provamos como esse juízo era apenas resultado do preconceito humano com outras formas existentes no mundo, porque o homem, sendo ele muito vaidoso, observava-se a si mesmo e imaginava que não poderia ser descendente da ameba. Na realidade, foi o próprio homem que criou todos esses conceitos, respondendo a um impulso de criar que é mais potente que ele próprio, pois este é anterior a ele.

II – A verdade dos filósofos

Todo pensador, seja ele filósofo, sociólogo, psicanalista, não importa, almeja primeiramente e, sobretudo, que seu pensamento seja sua forma de arte, pela qual será lembrado nos dias vindouros. Se o que ele pensou é verdade ou mentira, não tem importância alguma. O valor de sua obra apenas tem valor enquanto arte, e a apreciamos como se aprecia um quadro, um livro, um filme, etc. Ao afirmarmos isso, podemos inferir que quem faz o juízo de um pensamento só o poderá fazê-lo na condição de um esteta, de um diletante, o qual se valerá de seus sentidos para avaliar a obra. Será bom o que lhe agradar aos sentidos. O homem, por sua vez, poderá usar um pensamento igual se usa uma bela roupa: vestirá a que lhe assentar melhor e achar mais elegante.

III – As fases do julgamento do espírito

Desse modo, podemos apreender que o Espírito tem duas fases: uma criadora, quando se encontra em sua total capacidade; e outra, estética, quando o espírito ainda busca sua fortificação. Podemos nos atentar que, ainda que no senso comum, as pessoas costumam comprovar a si mesmas a autenticidade de uma verdade, através da sensação de bem estar que a crença nessa verdade transmite ao seu corpo, ou seja, é uma apreciação meramente sensível e estética. Não existe juízo que não passe pelo jugo do sistema nervoso. Restituímos ao corpo sua importância no julgamento. Essa é a nossa ética.

IV – O (não) sentindo da vida

Vemos a vida como ela é: desprovida de sentido. Movida senão por essa vontade imperiosa, de duas forças, opostas uma da outra, mas que, não obstante, harmonizam-se e se expandem, aleatoriamente, criando a si mesma e a tudo que existe no mundo. À maneira de bolhas de água que se formam e se misturam pela influência do vento, formando, dessa forma, uma bolha maior que subjugará outras pequenas bolhinhas, obedecendo, assim, a uma fatalidade totalmente sem sentido, ou antes, apenas ao acaso cego e a vontade de forças que as fizeram movimentarem-se, esta é toda a lógica que rege aquilo a que chamamos de universo, isto é: o “Nada”.

Apenas a constatação de que o “Nada” é o sentido da vida, é a atitude intelectualmente honesta diante do mundo.

É de acordo com essa constatação que nós, imoralista e estetas da vida, partimos como premissa da nossa filosofia. Pensamos o sentindo da vida igual uma folha em branco dependurada em um cavalete, no qual um pintor deverá

tecer suas pinceladas. Se o que pintar resultará em rabiscos ou numa obra de arte, dependerá da qualidade do artista.

Dave Le Dave II
Enviado por Dave Le Dave II em 12/05/2023
Reeditado em 14/05/2023
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