Odium est amor qui negatum est

Eu sou uma dinamite a explodir cérebros. Uma faca a esfaquear corações gélidos, só de nomes vazios. Eu sou uma explosão dos sentidos e das sensações. Um coração que conclama a si mesmo a glória e a honra dos deuses. Eu sou o mensageiro desde a pré-história. A cantiga das ninfas, a dança dos quartetos, a ginga e as sonatinas. Todas as formas, todas as sinfonias de todos os períodos, todos os períodos e todos os compositores, obra e autor. Eu sou toda a lírica melódica, toda harmonia clássica, moderna e todas as formas não tonais. Eu sou o infinito e o que está para além dele. Não tenho início que não seja o físico e não tenho espaço em que repousar, meu tempo é o atemporal e minha música é o indefinido. Absolutamente contingente, sem deixar de ser determinado, inferido, mesmo que em infinitas perspectivas (tendendo). És dançarina para o 'meu' corpo, o teu. És deleite para os meus verbos e prosas para a minha língua. És mulher, és ninfa; olhos teus nos meus é gozo e gozo sensitivo. Sublime, decaído, angélico é o teu nome: mulher. Como as musas, como as patrícias romanas és o que há de mais elegante, bela e travessa, mas como mulher também és o desespero de um amor perdido e como ato de puro heroísmo idealista preserva o seu amor tal qual concebido, se mata como Julieta. Os vermes que comem tua carne nessa tragédia é da mesma natureza e baixeza daqueles que desejavam te possuir, mas não possuíam a grandeza de amar uma mulher. Apaixonaram-se como os poetas gregos pela forma e corromperam a essência a concebendo como harmônica. Deturparam o teu corpo ao o colocarem na dimensão dos deuses, e outros aviltaram e profanaram a tua graça divina oferecida por Afrodite ao te chamarem de "gostosa". Por sua vez, os românticos mal entenderam a beleza da tragédia e, assim, do amor. [...] O coração é a janela com que o sublime é vislumbrado, por meio do tato, dos sentidos. Distorcem o teu amor como distorcem a arte ao teorizá-la em detrimento de senti-lá. Eu, como um bom poeta, ouso possuí-la sem tê-la e tê-la sem possuí-la, brincando assim com a semântica, como brincam os trovadores com as donzelas e os dionisíacos com o vinho. É na contradição, no não completo com que falo a tua língua e caio boquiaberto por debaixo. E por fim, assim canto:

Com que a graça me conceda

E eu tenha a tua honra,

O que fazes por debaixo dada

Ao desespero deste homem.

Atormentas a minha sina,

Tão poética embriaguez,

És disforme linda menina

Com que 'debaixo' és meu deus.

Assim perco-me na rima,

Mas não deixo a poesia,

Eu sou só metapoesia,

Já a mulher é obra-prima.

Por fim, contigo me perduro,

Me completo no incompleto

Sinto-me, e senta-se no impuro,

Unimo-nos no concreto.

Já não há mais o secreto,

As tuas rimas são meus versos

E o teu deleite indigesto,

O mistério com que converso.

15/01/23

Darach
Enviado por Darach em 08/05/2023
Código do texto: T7783351
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