Incansável
Sinto-me incansável hoje - não sei se sou assim o tempo todo, espero um dia descobrir.
O que não se cansa em mim é essa fome desvairada de querer entender as estações chuvosas internas e felizes, os intensos meses solares vividos neste corpo nu que é destituído de tudo quanto tenta vestir sentido.
Incansável eu sou neste instante de lividas preocupações, meneando a cabeça à elas, querendo dize-las o adeus que tanto guardo.
Os olhos de uma borboleta cintilam no escuro de meu jardim, neste instante senti que não quero me deixar para trás, que sou como ela, e como sua frágil vida, minha sensação de não me cansar uma hora há de morrer. Enquanto penso no que perderia caso deixasse essa sensação passar despercebida, eu resolvo vivê-la ao máximo agora.
Incansável - tão simples mas ao mesmo tempo tamanho mistério. Num relance vejo minha sombra na parede e ela disse-me que dentro do vazio reside algo enigmático tanto quanto no espelho onde reflete a imagem nítida e real. Os limites do que pode-se conhecer realmente, enganam a mente? E neste lúdico leito onde me repouso, peço aos céus que o dia nunca morra, que ele seja pregado na cruz da eternidade, que ele sinta-se como eu me sinto neste instante: com um vigor juvenil inexplicável nas tentativas de me compreender perante um mundo externo e em movimento, repleto de borboletas felizes e tolas que como a minha sensação, acho que me visitarão no instante de uma possível eternidade.
E eu me pergunto no silente escuro: tudo o que estou a sentir não passa de um jogo? Qual sentido disso tudo afinal? Então me levanto, pego meu roupão e ando pelas ruas vazias enquanto chove. Me recusei a dormir pois me recuso a viver o dia de amanhã se ela, a sensação do incansável de fato não me despertar com um "bom dia" em seus lábios.