Sentimentos silenciados

Por vezes adotamos uma postura nada saudável perante as outras pessoas, sobretudo àquelas com as quais convivemos, temos algum tipo de relação, ainda mais quando se tratam de relacionamentos íntimos. Uma postura que ao invés de fortalecer os laços e enriquecer os vínculos, acaba causando distanciamentos que resultam em enormes e verdadeiros abismos entre nós e quem importa. Trata-se de um comportamento silencioso, que não faz barulho, que não estronda, que não é tão enérgico em sua manifestação. Aliás, se quer possui alguma energia. É o de se manter calado, de boca fechada, sem dizer às pessoas o que estamos sentindo em relação a elas. Refiro-me às declarações de sentimentos como amor e carinho, tão importantes para mantermos vivas aquelas coisas que um dia nos uniram. Mas refiro-me ainda sobre aqueles sentimentos desagradáveis, como decepção e até raiva, de quando não gostamos de algo que foi feito ou dito. Ficamos de “cara amarrada”, mau humor, e nada dizemos para que a situação mude, seja resolvida, para que, da forma mais adulta e madura possível, possamos resolver nossas diferenças e seguir em frente.

E esses sentimentos silenciados vão ganhando proporção dentro de nós, vão alimentando-se de mágoas e rancores que insistimos em cultivar sem que percebam, sem que tenham a chance de compreenderem que suas ações foram interpretadas por nós de forma dolorosa. Ficamos em silêncio pensando que aos outros cabe a adivinhação do que estamos experimentando. Ficamos em silêncio ignorando o fato de que precisamos falar aquilo que nos aflige. Precisamos dar uma chance para que se expliquem ou se desculpem. Nós mesmos não sabemos quando é que nossas palavras feriram e nossos gestos machucaram. Não seríamos gratos se tivéssemos a oportunidade de saber e, assim, pedir perdão?

O problema é que temos um ego frágil, sensível no sentido ruim. Sensibilidade é importante na vida. É através da sensibilidade que a dor do outro nos toca e, assim, oferecemos nosso apoio, nossa ajuda e nosso conforto. No entanto, a sensibilidade a qual me refiro é aquela do nosso narcisismo, da nossa maneira egoísta de compreender o mundo, como se fôssemos especiais demais para que errassem contra nós. Nessa postura imatura, além de ignorarmos o fato de que também erramos, desprezamos que cada um de nós somos seres humanos suscetíveis aos erros, aos equívocos, como também capazes de corrigir nossas falhas e reconhecer quando passamos de certos limites.

Vamos nos calando, ficando em silêncio, a outra pessoa cria inúmeras hipóteses e nós, praticamente esperando por um milagre, desejamos que ela simplesmente tenha a capacidade de ler nossos corações. Não é assim que viveremos bons relacionamentos com as pessoas que amamos, sejam elas nossos pais, amigos ou cônjuges. Viveremos relacionamentos saudáveis se tivermos disponibilidade para sermos claros e transparentes em nossos sentimentos. Não quer dizer que devamos anunciá-los aos quatro ventos. Quer dizer apenas que precisamos reconhecer que o outro pode ter nos ofendido sem que fosse sua intenção, sem que fosse premeditado, sem que fosse esse o objetivo traçado. Valerá a pena perder o que existe por orgulho? Por uma ideia ingênua de “ser especial”? Você não é especial para o mundo, sinto muito. Mas pode ser especial para aquela pessoa que cometeu um simples deslize e que, com a sua ajuda, pode entender a melhor forma de amá-lo.

(Texto de @Amilton.Jnior)