SAIA DA MINHA VIDA !

A frase, lançada assim, de supetão, adentrou os tímpanos causando um estrago danado naquele coração invigilante. E a fala seguia, devastadora e cruel: “Venho tentando de tudo para lhe mostrar que não te quero mais. Aliás, em verdade, nunca quis mesmo”. Verdade ! Foi por aí mesmo. Porque o ouvinte( vítima) permanecesse silente, a dama falaz persistiu em sua peroração agressiva. Debalde, sua plateia estava ausente. Embarcara no pensamento imaginário comprando passagem de urgência para um certo passado, causa primária daquele momento. Viagem difícil, há que se reconhecer, mas deu para chegar lá, sem incidentes, embora com algumas turbulências e rajadas de ventos “de través” no pouso de suas recordações. Recolhendo textos ruins e bons reeditou o enredo da estória, “que poderia até ter sido legal e feliz”, avaliou em sua mudez estupefata, salvo pelo franzir característico dos lábios, a dizer: “não fossem seu egoísmo e vaidade estúpidos”. Inegável que se tomara de amores por aquela criatura, então mansa e afável. Fora cativado por uma beleza, que, embora discreta, sobressaia-se sobre as demais por um "que" de "não sei o que". Ah, aquelas covinhas nas faces, ancoradas no sorriso branco e franco que o azul dos olhos realçava, derrubava qualquer cidadela fortificada, cristã ou infiel. E foi assim que capitulou, vítima do ataque avassalador daqueles dons e dotes a massacrar sua timidez de homem e poeta ou poeta-homem, sabe-se lá o que passara a sentir que era. Estranhamente, com ela, temia pelo fim de seus sonhos tranquilos de paz e serenidade. Mesmo assim, debitou tudo na conta do tempo imprevisivel. Vivenciou o dito comum do populacho. Foi seu amor, seu amigo e seu amante. Fiel até o limite do razoável, mesmo sem a contrapartida do lado de lá. Paciência, sentia-se dentro de um circulo cármico nessa relação desbalanceada, nesse encontro ou reencontro mal programado. Depois, como é de costume acontecer, veio o distanciamento e suas formalidades. Monossílabos eram senhas de “fim de caso”. Caso esse, que, em verdade, nunca fora seu. Afastou-se enfim, com a sensatez dos que sabem lidar com a razão e o desprendimento. Daí a razão, talvez, do descontrole verbal que o açoitava e que o trouxe de volta ao presente que o achacava com verbos e adjetivos contundentes que sabia agora não lhe dizerem respeito. Fixou seu olhar, entre sereno e firme, naqueles olhos azuis agora sem o brilho e a sedução de outrora e retrucou suavemente: “Como sair de sua vida? Por favor, volte à realidade. Ninguém sai de um lugar onde jamais entrou” E num arroubo de coragem surreal arrematou triunfante: - "Por Tutatis" ! Vá para o inferno, pois estou indo na direção oposta”. E dando de costas, solenemente, saiu embevecido, abraçado ao seu amor-próprio sofridamente reconquistado.

palhinha