Sobre saber perder

Toda escolha carrega em si, pelo menos, uma perda. Toda trajetória tem seus desgastes de energia, das solas dos sapatos, do tempo que se vai... Enfim, não há como viver sem passar pelo metabolismo, sem adquirir rugas.

Nas sombras da minha maturidade em progresso, muita coisa ainda me dói e entristece, meu temperamento melancólico-detalhista me faz contabilizar o que se foi e o que eu tenho deixado de "ganhar na vida".

Parece-me que o entendimento de que a Vida oferece aquilo que mais se ajusta à nossa necessidade de aprendizado, ainda não chegou à luz da minha própria consciência. Mas eu sei (com a mente racional) que essa lógica se encontra além do que eu sou capaz de captar agora, pois "tudo que sei, eu sei em parte, mas quando vier o que é perfeito, verei claramente" os ganhos que cada lágrima (que no momento parece vã) significam para eternidade.

Sempre há o orgulho por parte dos religiosos ao citar a beleza do ensinamento de seus mestres e guias, agora que esses já estão consagrados, agora que se fundiram à história, agora que já se estabilizou a "conta das suas vidas" e que já foi aceito o saldo que deixaram. Mas... Será que realmente nos esforçamos para ver um pouco além do imediato? Os nossos curtos prazos compreendem que caminhar bem é bem mais do que estimar em que status a nossa vida se encerrará?

Cabe a nós, que temos Mestre muito maior que nós mesmos, abrir mão da ilusão de vitórias medíocres, das tentativas de amainar as dores da nossa alma com falsas promessas de uma "felicidade" momentânea, baseada na satisfação de desejos que logo passarão, baseada nos paliativos que nunca se bastam e somente fazem crescer o vazio que nos conduziu a buscá-los.

"Quem quiser ganhar a sua Vida, irá perdê-la", disse Jesus Cristo. O tempo inteiro nos esforçamos para chegar ao máximo de ganho, mas as adversidades surgem para nos fazer parar e questionar qual detalhe temos perdido, por qual motivo temos lutado, se realmente temos apreciado as chances de evolução que nos são propostas. Talvez valha a pena perder alguns "benefícios" visando salvar a própria alma, abrir mão de prazeres de base adoecida, deixar de lado a hesitação e a hipocrisia por medo da perda do que jamais nos pertencerá, pois o que é realmente nosso, não se aparta de nós e durará eternamente.

Descobri que somos sementes de algo que pode brotar, mas para isso, precisamos nos desfazer para vir a Ser o potencial que guardamos. Em minha jornada sou submetida a ver morte diária de antigas versões de mim que se despedem, daí tenho que lidar com as novas, são os ciclos. Já faz um tempo neste caminho que eu me encantei pela maneira crística de Ser e neste reconhecimento, há de se incluir "considerar qualquer coisa como perda, se comparado a conhecer o Amor divino" que é o grande ganho que eu poderia ter por aqui.