Sobre ainda não estar pronta

A angústia gerada por almejar a cura imediata surte o efeito contrário, me adoece muito mais porque à medida que desrespeito meus limites para acompanhar o ritmo frenético dos demais, o cansaço me devolve à estaca zero, rastejando sem forças e buscando recobrar o que restou da dignidade.

Pareço lenta, desligada (tudo bem, eu sou estabanada por natureza), preguiçosa e sem garra, mas não fui sempre assim. Nem pretendo ser, aliás. Tenho poucas certezas além da morte e de que tudo sempre passa, sendo uma delas a de que estou em processo de desconstrução e reconstrução.

Ninguém dá nada por mim agora, sou uma equipe rebaixada, um pênalti que bateu na trave, uma árvore sem galhos, uma presença indiferente. O julgamento é sustentado pela superfície, mas há muito mais acontecendo por detrás das cortinas. Ninguém, entretanto, quer caminhar tão longe assim.

Eu costumava dar conta dos compromissos, trabalhar com prazos e até destinar tempo ao lazer sem me prejudicar e hoje se eu consigo executar as tarefas mais básicas já posso dizer que foi um bom dia.

Vejo minhas outras amigas escrevendo dois ou mais livros no mesmo ano e eu mal consigo escrever como antes porque custa muito e há vezes em que tamanho é o desespero que sinto vontade de dormir e não acordar mais por me sentir um peso morto, uma vez que nem mesmo consigo fazer o que eu mais amava.

Demorei muito tempo para me reconhecer doente, engolir o orgulho e pedir ajuda. Pode ser que para o senso comum eu já devesse ter reagido, no entanto, as cobranças fazem com que eu sinta culpa por todas as tentativas de ficar bem terem falhado ou porque não dei aquela tão aguardada volta por cima. Dei tudo de mim e continuo dando, só não é tão simples assim.

Eu não sou as minhas pendências, os compromissos adiados ou esquecidos, os lapsos de memória gerados pelo nível mais extremo da ansiedade. Eu ainda sou uma pessoa, uma pessoa que merece carinho e respeito porque as críticas destrutivas você pode enfiar lá naquele lugar, não faço questão delas nem de quem se alegra em ver o próximo sofrendo.

18/12/22

Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 18/12/2022
Reeditado em 16/01/2023
Código do texto: T7674994
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