Nossa quietude

Ônibus lotados. Carros apressados. Crianças agitadas. Adolescentes eufóricos. Ambulantes trabalhando. Motoqueiros entregando. Pedreiros construindo. Atendentes telefonando. Açougueiros cortando. Mães gritando. Amigos gargalhando. Árvores dançando. Vento soprando. Chuva caindo. Trovão rugindo. Avião roncando. Janelas batendo. Portas abrindo. Sirenes tocando. O mundo lá fora acontecendo. Assim é a vida. Um constante movimentar e soar. Uma constante sinfonia incansável, intermitente, infinita. Não há silêncio. Não há pausa. Não há lacuna. Nem mesmo no sossego da madrugada. Aliás, talvez a madrugada seja o momento dos mais intensos e angustiantes barulhos. Aqueles que apenas nós conseguimos ouvir, que o travesseiro não abafa, que o controle remoto não abaixa, que o fechar de portas e janelas não afasta. Aqueles que sopram em nossas mentes preocupadas, aflitas, ansiosas. Aqueles que não nos deixam dormir, descansar, relaxar. Aqueles que nos fazem pensar que a vida é perigosa, tensa, insatisfatória. Aqueles que soam de pensamentos carregados de caos, tragédia, desesperança. Pensamentos que pesam, sufocam, enfadam. Pensamentos que questionam, interrogam, confrontam. Mas que não respondem. Pensamentos que não se calam...

“Só precisamos permanecer em quietude, as coisas revelam-se nas águas claras do nosso coração” (Thich Nhat Hanh)

Esses pensamentos não se calam porque nós não permitimos que nossa mente se esvazie e se tranquilize. Ficamos em ruminação. Ou em fantasia. Repetimos em nossa mente como as coisas foram e lamentamos como poderiam ter sido. Projetamos em nossa mente como pode ser aquele dia que nem sabemos se poderá chegar, mas que já causa em nós ansiedades e preocupações. Vale a pena? Vale a pena ficarmos nesse barulho incessante que apenas nos apavora e incomoda? Não conseguimos calma, paz, nem quando o mundo lá fora se aquieta, porque o mundo aqui dentro continua em polvorosa.

Silencie-se. Faça uma pausa. Respire. Sinta a respiração. Sinta o pulmão se encher. Agora sinta ele se esvaziar. Sinta seu corpo. Sinta a respiração sair por suas narinas e tocar levemente a pele acima de seus lábios. O que há no seu entorno? Que som? Que cheiro? Que sensação? Olhe esse pensamento intruso. O que ele tem a dizer? Acalme-o. Feche os olhos se necessário. Deixe que as perguntas venham. Permaneça quieto, em silêncio, em pausa. Não vá em busca de respostas. Não agora. Não durante a quietude. Permita que a tranquilidade da sua consciência se clarifique através da paz de uma pausa da correria desenfreada. E as respostas virão. Sem barulho, sem afobação, sem ansiedade. Simplesmente virão. E se não vierem, é porque já foram dadas: não existem. É hora de seguir em frente. Em paz. Com serenidade. Aberto. Disponível. Pronto para descobertas que obsessões por perguntas antigas não permitiriam que fossem acessadas. As novidades da vida são poderão chegar quando, depois do silêncio, compreendermos que certos apegos, além de dolorosos e desnecessários, interrompem o natural fluir da impermanente vida.

Silencie-se.

Acalme-se.

A vida não precisa ser esse estrondoso barulho de uma mente angustiada.

(Texto de @Amilton.Jnior)