MEDITANDO SOBRE A DOR
“O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente”
A dor!
O que é a dor?
Tê-la-ia um corpo, quem sabe?
Sê-la-ia [para nós] necessária?
E como seria a vida... sem ela?
Seria [aqui] possível?
Uma dor [nest’hora] vigora, e todos a experimentam
Desta que ficará em “seu tempo”
E, depois, dará o fora
Afinal, nada neste mundo é permanente
Mas, não é que muitas vezes até parece que reclamamos
... d’alguma dor... que partiu e foi embora?
É verdade:
Ressuscitamos a dor que morreu... quando dela lembramos
E, no que se dá a entender, gostamos de falar d’ela
Da dor que não mais neste tempo (o presente) existe
Todavia habita em nossa memória
E, deste modo, outra vez sofremos (embora d’outra forma)
Ou será que não conseguimos viver sem nossas dores e, assim,
... a buscamos novamente d’àquela que num’hora nos deixou?
Ou será que sentimos, na verdade, é "saudade" de nossas dores?
Eita! o ser humano é mesmo complicado...
Sentimos “dores futuras”
No que padecemos “por antecipação” em função de nossas angústias
Dores que nem sabemos se as teremos, da verdade a ser dita
Como que a chamá-las antes de surgirem em nossas vidas
E neste instante eu faço a quem me lê... uma pergunta:
- Como seria uma vida... sem dor?
Seria “suportável”?
E eis que provavelmente ouviria a seguinte resposta:
- Insuportável é uma vida dolorosa
Mas, eu não indaguei sobre uma vida "somente" com dores
Eu perguntei como a seria se não houvesse nenhuma [dor]
- Oh! Mas eu não suporto dor. - Ao que diria alguém
- Ah! - exclamo eu. – Então achas que suportaria viver sem nenhum’algia?
Dor de cabeça... dor do parto... dor de infarto... dor de barriga...
... dor de estômago... dores nas juntas... articulares... musculares...
... nevralgias... neuropáticas... queimaduras... acidentais...
Algumas agudas, outras crônicas
Dores físicas, na verdade (somáticas)
E também as dores da alma (ou da mente):
Algumas lembranças... arrependimentos... remorsos... desejos... culpas...
... sentimentos vários... angústias... medos.... desespero...
E como não falar da dor da traição sentida?... ou da mágoa?... ou da
... "rasteira tomada"...? ou da "tocaia" recebida?... ou da ofensa ganhada?...
E como não dizer, sobretudo, da dificil dor... "do luto"?
Ah! sobre esta eu duvido que exista... uma pior!
Mas a verdade é que são tantas dores...!
E nest'hora eu me fico a perguntar:
Quais dores são piores: as do corpo ou as da alma?
E aqui eu te faço uma interessante pergunta:
Se você não sentisse a aguda e cruel dor lateral no abdome
... como saberia que estaria tendo uma crise de apendicite?
Ou se não sentisse uma precordialgia (proveniente de uma crise de
... angina) como se livraria do prosseguimento (a que se daria)
... de um infarto do miocárdio?
Entendeu agora o motivo da dor ser, então, necessária?
Pois é! Não é "sacanagem" da vida, não!
Todos nós temos que viver os “mistérios dolorosos”, querendo ou não
De nosso barco que ancorado não pode ficar para sempre no cais do vazio
Ou d’uma vid’ausente a então ser
Isto é, negada "quando" vivida em suas não tão prazerosas experiências
E se queremos saber o que existe na ilha distante temos que navegar
... pelo turbulento oceano do sofrimento
Como a se dizer: temos que passar pelo caminho do calvário
Alguns (a maioria) falam que não devemos aceitar nossas dores
Contudo, se são realmente “nossas”, devemos, sim, acolhê-las
Já que a Vida nos deu!
Pelo menos enquanto estivermos vivos
Considerando que só os mortos é que não sentem... dor [alguma]
Sendo assim, a dor é “útil” (para quem "está" vivo)!
Mas, e então, seria mesmo a dor “real”?
Ou sê-la-ia fruto d’uma “concreta imaginação”, a ser "coisa de nossa cabeça"
... (como a s'estar preso n'um pesadelo)?
A verdade é que tudo é real desde que “seja” e sinta
Do contrário se viveria qual um boneco de brinquedo a que "teria"
... um corpo, mas não "seria" uma alma
Vivendo os que fogem de suas dores... uma vida vã e sem sentido!
Oh! da dipirona (novalgina)... à morfina
Do anti-inflamatório... à cocaína (ou à heroína)
Ou mesmo da cervejinha... às grandes farras nos finais de semana
E o que não dizer d'àqueles que buscam s'esconder nas igrejas
... de suas angústias e desesperos?
Queremos fugir... de nossas dores, é fato
E queremos nos entupir de endorfina, serotonina, dopamina, ocitocina...
E desejamos avivar nossos neurotransmissores não importa por qual
... tipo de estímulo
Ou mesmo se são lícitos ou proibidos
“O que não deve e, portanto, não vale... é sentir dor!”
Afinal, ninguém aqui é masoquista!
E, dado ao que se viu, tentamos escapar da dor nossa de cada dia
A que não a queremos hoje... nem nunca
Meu Deus! Será qu’estamos nos enganando por nossas tentativas
... de fugir e correr da dor?
E nest’hora eu lhe faço um’outra pergunta:
- Acaso você já observou que outras pessoas também sentem dores
... e que, portanto, não és o único a passar por ess'amarga experiência?
Ou tens olhos somente para o teu próprio umbigo?
Ah! a verdade é que te preocupas por demais consigo,
... e não tem olhos para mais ninguém!
E fica o tempo todo "enchendo o saco" da gente
... a reclamar da vida feito um "Jó" da Bíblia!
Deus me livre de ti, some p'ra lá!
Ou será que abrigas [em ti] o estranho prazer de contemplar a dor alheia?
Se este for seu caso, és, então, um psicopata!
Uma pergunta final:
Você porventura já foi causa d’alguma dor em alguém?
Ou seria mau o bastante para querer assim o fazer [em seu cotidiano]?
Reflita bem!
Bem, hoje é sexta-feira
Dia de rezar os mistérios dolorosos do santo rosário
E é o que irei fazer agora
Pode ter certeza, meu amigo
"Alguém" já sofreu muito mais que você
Pare, então, de se queixar
11/11/2022
Post Scriptum:
Inspirado no texto “CONSTATAÇÃO” da poetisa Regina Ninna
https://www.recantodasletras.com.br/poesiasdetristeza/7644950
IMAGENS: INTERNET
MÚSICA: Ani Choying Drolma
https://www.youtube.com/watch?v=eHw013uE9dk