Uma lógica do nonsense
Como comportar contradição em um sistema?
1° Se é uma aparente contradição, logo, não é uma contradição efetivamente falando.
2° Se o princípio da explosão não é válido, segue-se daí um sistema não-trivial.
3° (Minha hipótese) Se a refutação na verdade é a negação que subsiste a existência do próprio sistema.
Não-idêntico e antítese
(Todo sistema é contraditório ou não-trivial)
I
Recobrando aqui o texto sobre o sistema do absurdo ou absurdo, a segunda proposição menor do segundo silogismo na verdade é uma falácia, pois nela contém outra proposição que encaminha diretamente à conclusão. Em veracidade ela é uma das mais abrangentes proposições, nos leva ao questionamento do que vem a ser uma lógica absurda ou do absurdo, está implícito em seu pronunciamento a conceituação de proposição absurda aquela que segue-se da "negação" da proposição ortodoxa. O que não é em todo caso verdade, pois a lógica heterodoxa é aplicada a sistemas específicos, dado o contexto e como cada proposição ou objeto relaciona-se com outro, relação esta imposta para além da semântica. Tal sistema é denominado de não-trivial e, especificamente na lógica paraconsistente, segue-se que de uma contradição não deriva-se qualquer coisa, ou seja, não obedece ao princípio da explosão. A partir dessa proposição é possível derivar uma conclusão que seja verdadeira e falsa ao mesmo tempo, daí a necessidade de se distanciar cada vez mais da linguagem natural com suas expressões direta ou indiretamente autorreferenciais, como bem aconselhou Tarski.
Segue-se classicamente, se uma teoria, hipótese ou proposição é inconsistente, por definição é contraditória, por estar relacionado diretamente a consistência de uma teoria, hipótese ou proposição a sua validade enquanto capacidade de pronunciamento de sentenças ou proposições verdadeiras (como conclusão, semelhante a terceira asserção de um silogismo). Relacionando, assim, também a verdade com o não contraditório. Portanto, aqui a teoria da verdade está fundada na bicondicionalidade entre verdade e consistência e entre consistência e não contradição. Segue-se que, se verdade, então não contraditório e se contraditório, então não verdade, haja vista, que na lógica clássica contradição é igual ou equivalente a trivialização. Logo, teremos que um sistema é verdadeiro se e somente se não possui trivialização, ou seja, contradições, em termos lógicos teremos,
(v <--> c) ^ (c <--> ¬r) <==> (v <--> ¬r)
Sendo, r ≡ t
(v <--> ¬t).
Tal princípio está fundado, a priori, em um pressuposto ontológico, o qual afirma que uma coisa é ou não é, não podendo, assim, ser e não ser ao mesmo tempo, como bem refletiu Parmênides a respeito do ser, contudo, convém questionar se em tal adoção de princípio lógico subsiste algo a mais em sua estrutura como fundamentação, logo, determinante ou se esta estrutura lógica aplicada ou não a metafísica (determinada dimensão) é por si.
A lógica clássica ou todo sistema que utiliza-se dela é trivial, ou seja, é falso se houver trivialização, também é verdade a sua contrapositiva. Atendo-se ao princípio da não contradição e que ele está relacionado ao princípio da identidade, tal como, A é A e, portanto, não pode ser B, tal princípio é correspondentista, pois 'a' equivalente a 'b' diferente de 'a' não equivalente 'b', é pressupor que todos os elementos do conjunto A é igual a do conjunto B, ou seja há uma correspondência ou congruência entre ambos (também pode ser por correlação). Da mesma forma vemos o princípio de identidade subjazendo a teoria da verdade de Aristóteles (não é à toa a sua semelhança com o enunciado de Parmênides "o ser é e não pode não ser e o não-ser não é e não pode ser de modo algum"),
"Dizer do que é que é e do que não é que não é é dizer a verdade e dizer do que é que não é e do que não é que é é dizer algo falso".
Ou por outra, só podemos estabelecer relações entre objetos de equivalência ou qualquer outra, se tal objeto é igual a si mesmo, ou em teoria dos conjuntos, contém a si mesmo, pois só assim teremos n objetos distintos um do outro. Assim, poderíamos dizer que, sendo A igual a B, A é B ou B é A como disjunção inclusiva. É equivalente a dizer, "A é A e B é B". Afinal, só há dois objetos se forem diferentes, senão, há apenas um. Da mesma forma se tal afirmação pertencesse na verdade a teoria deflacionária, pois o que fundamenta o princípio da identidade conjuntamente com suas relações é o real e a verdade do objeto "dado", não é por acaso que em todas as teorias acerca da verdade, seja ela pela dimensão epistemológica, metafísica ou semântica, não se questiona a existência da verdade, ou seja, pressupõe-se que ela existe, pois sendo uma construção sob a ótica da lógica ortodoxa, argumentar que a verdade não existe é falar algo a respeito de algo, que por definição deve ser verdadeira, senão, ela existe e se tal conceituação é verdadeira, então por tautologia é uma verdade e em termos clássicos um absurdo.
" 'Sinto cheiro de violetas' tem o mesmo conteúdo da frase 'é verdade que sinto cheiro de violetas'. Assim, parece, então, que nada é acrescentado ao pensamento por eu atribuir a ele a propriedade da verdade." (Frege)
Assim sendo, o que determina o princípio de identidade, por conseguinte, o princípio da não-contradição e o da explosão é a experiência com o objeto e a verdade "dada" a respeito dele, que é intuitiva, daí o porquê dessas teorias da verdade serem ditas as mais intuitivas. Rematando, é apenas na dimensão pragmatista que vislumbramos com mais totalidade e profundidade a questão acerca da verdade, pois a disrupção entre minha teoria e o objeto é o que produz a mudança de paradigma, não à toa Newton da Costa já comparou a vinda da lógica paraconsistente com o da mecânica quântica ou da psicanálise.
II
Com o fracasso do iluminismo em explicar tudo por meio única e exclusivamente da razão representado pela figura do último iluminista (Kant), ao observar a impossibilidade de fundamentar sua ética exclusivamente na razão, uma razão unificadora, foi pensado por alguns que a razão estava morta, mas isso não é verdade. Pois o elemento do não-idêntico _ desde a dialética socrática representado pela antítese ou no outro de Rousseau ou modernamente em Lacan _, sempre permanece frente a toda tentativa de conceituação. Como descreveu bem Adorno, a filosofia clássica vem tentando unificar o elemento do não-idêntico em suas filosofias há alguma outra coisa, no intuito de atribuir a ela uma síntese, uma identidade, por exemplo, atribuir identidade a antítese (não-idêntico) em Hegel, a unificando a tese, formando assim o processo dialético da história. Seja também por meio do maniqueísmo, ou seja, por meio da metafísica ou outra abordagem qualquer. O que subsiste a todos esses sistemas é e continuará a ser o não-idêntico, pois sua identidade está em algo-outro, isto é, por se tratar de um outro (objeto em termos filosóficos) sua conceituação está subordinada ao confronto (assimétrico por definição, pois são distintos) com o objeto, até então algo. Aquele, esse ou este é por definição incompleto em sua determinação, pois ao falar de algo-outro continuo a falar de um não-eu, sendo o eu definido, completo, idêntico a si mesmo, determinado até ser questionado, confrontado, posto em contato com o não-idêntico, que é um outro para este eu. Aliás, pensar é determinar, mas "aquilo que é, é mais do que ele é". Ao falar sobre algo estou a determiná-lo, porém, para determinar algo é necessário conhecer todas as suas dimensões, seus limites, isto é, ter um compreensão do todo, una a respeito dele e isso implica assumi-lo como uno, completo, eis a nossa concepção de identidade. Concepção esta derrocada pela psicanálise, onde basicamente a unidade do eu sobretudo corporal (em Freud) e das resoluções dos conflitos identificatórios desde o estádio do espelho (em Lacan) é imaginária.
III
À vista disso, o conceito filosófico mais verossímil a interpretação dada sobre a lógica paraconsistente e a sua teoria da verdade, ou melhor, quase-verdade é o do não-idêntico. Utilizando o cálculo C1 para expressar a verdade paraconsistente,
α° ≡ α´ <==> ¬(α & ¬α)
O teorema da dedução,
Γ ⊢ A --> B
Em que Γ é um conjunto de fórmulas e A e B fórmulas quaisquer. Utilizando também o axioma A1 do sistema C1,
α --> (β --> α)
Sendo que a letra β está representando a inconsistência de um sistema e α a verdade dele, por fim, negando a proposição t da fórmula anteriormente obtida (é verdade se e somente se há trivialização), obtemos,
(α <--> t) ==> α´ <==> α --> (β --> α) <==> ¬(α & ¬α).
Traduzindo, um sistema é verdadeiro se e somente se há trivialização implica na verdade paraconsistente, que é equivalente a afirmar que se um sistema é verdadeiro, então inconsistência implica verdade, que é equivalente a afirmar que o sistema é falso e verdadeiro ao mesmo tempo. Sendo o sistema um conjunto de fórmulas em que há trivialização ou inconsistência e α' outra fórmula, que expressa a verdade paraconsistente (¬(α & ¬α)), temos que
{α1, ...,αn} |= α' sse |= (α1 &, ..., & αn) --> α'
Em que a primeira fórmula é uma consequência lógica e a segunda uma tautologia, assim obtemos o teorema paraconsistente da dedução,
(α1 &, ..., & αn) --> α'
Onde (α1 &, ..., & αn) é a hipótese (como fórmula) ou conjunto de hipóteses (como análise de proposições). O teorema nos diz que para todo sistema ou asserção há nele mesmo como base geradora a sua negação (o não-idêntico), pois o conjunto de hipóteses implica a verdade paraconsistente.