A chuva.
A noite que abrigava tantos pontinhos luminosos no céu -histórias de milhares de anos-, foi ocupada por uma massa cinzenta e volumosa, por onde passava apagava o brilho daquelas estrelas radiantes. O primeiro pensamento era que aquilo significava destruição, que acabaria com a esperança. Tantas noites passando tão ansioso, onde só a luz daqueles pontos luminosos pareciam me levar a algum lugar que nunca achei, mas mantinha a esperança de fazê-lo. Então, tirar aquele brilho de mim, simplesmente me deixaria perdido, avulso, uma carcaça sem a alma.
Aquela massa por fim cobriu todo aquele véu noturno que outrora fora coberto de brilhos e alguns caminhos sem fim. A massa era avassaladora, não me permitia enxergar além, não havia escapatória para o que quer que ela houvesse reservado para mim. Derrotado, simplesmente derrotado, à observei. E finalmente aquilo brutal que eu estava esperando veio, em forma de uma rajada de luz que percorreu o céu nublado, seguido de um som alto, estrondoso, irredutível. Aquilo fora majestoso, por mais que assustador, o que quer que estivesse por vir seria pior que isso, se é que fosse possível.
Um ponto em minha testa, molhado: um pingo. De onde teria vindo eu não fazia ideia, naquele jardim não haviam irrigadores. Mais um, na minha mão, apoiada no meu joelho. Corri em busca de proteção, eu não estava preparado para aquilo. Já dentro do chalé, eu me encolhi a um canto daquela sala vazia, e finalmente ouvi. Milhares daqueles pingos atravessando horizontalmente lá fora, eu já estava à uma distância segura da janela, mas a vontade de me aproximar era enorme. Por fim, recostei a cabeça na janela, e observei-a enquanto caía no jardim.
Ela chegou poderosa, irredutível. Logo depois, diminuiu o ritmo, se tornando calma, mas contínua. Eu ainda conseguia ouvir alguns trovões ao longe, mas não mais me assustavam, eram agora inofensivos, pois os pingos abafavam aquele estrondo luminoso. O som dos pingos que batiam nos azulejos -e até os menos sortudos que terminavam suas viagens no telhado-, todos eles me acalmavam, traziam paz ao meu espírito, não me faziam querer buscar um caminho de ilusões chamativas, me mostravam o valor do caminho que eu já estava trilhando.