As manhãs num país em guerra
Faz horas, talvez dias, talvez meses que tento escrever sobre o sentir a política. Já não sei quanto tempo. Se passaram quatro, oito anos e ainda sinto o mesmo.
Hoje não ouvi nada que não fosse a cidade. Tenho feito muito isso, inclusive.
De um lado há a liberdade, silenciada, do outro a opressão, ensurdecedora. Sinto a liberdade, pois a sou e como ela, me coloco no mundo do qual tentam me recalcar. Caminho entre a opressão que tem em seu mundo apenas um corpo, uma ideia e uma simbologia. Nesse mundo, os não iguais se convencem de que são iguais, buscando fugir da dolorosa realidade de não pertencer ao campo que os dominam.
Há também uma consciência vagando pelos becos da ignorância. Assim como a liberdade, a consciência também me é e é calada. Escuto os gritos irracionais da ignorância, enquanto vários porquês se formam em minha ignorante consciência coletiva. Não reconheço o mundo em que estou, mesmo ele sempre sendo como é: os não iguais recalcados do mundo dos iguais.
Também vejo muitos medos do meu lado. Medos de perder migalhas, medos de perder milhões, medos das migalhas e dos milhões ocuparem um campo comum. Medo do irreal, do real, do inconsciente. Medo de não terem medo.
Alguns que ainda não alcançaram a liberdade optam por se aprisionar ao mundo que os recalcam. E vários porquês se formam em minha ignorância pessoal, eu não entendo.
Olhando mais a fundo, vejo diversas representações de algum Deus. A opressão o cria para dominar os não iguais, estes, por sua vez, o aceitam por medo do inigualável, inatingível, irreparável... Ainda não sei ao certo. Há também uma representação consciente de um Deus como um refúgio, mas que se tornou temível devido a apropriação da opressão.
De alguma forma sinto a ignorância, o medo e as representações desse Deus. Eu, como liberdade, grito, já que o silêncio contraria minha existência. Ao mesmo tempo, sendo a liberdade, estou sucumbindo ao meu oposto.
Assim sinto meu grito soando sozinho, num desespero coletivo que silencia. Grito estando na rotina dos iguais, sendo não igual. Grito colocando meu corpo fora das ruas ou dos grafites, o tornando real dentro de um certo campo. Grito esperançando, ainda elevando os meus além de mim. Grito existindo, como liberdade, assim, como a outra ordem.