Deficiência Humana
Já não posso mais ver uma placa de vaga exclusiva para deficientes sem me lembrar de uma ocorrência inusitada relatada em algum jornal. Alguém desrespeitou a vaga reservada a deficientes, e ao voltar encontrou um cartaz em seu carro dizendo que a vaga era reservada para deficientes físicos e não mentais.
Essa história sempre me confrontou com o real significado da palavra deficiente, e como, nossa visão de deficiência é deficiente – trocadilho mais que justificado.
Cito a esse respeito o seguinte poema que, muito embora atribuído popularmente a Mário Quintana, teve a autoria reivindicada por Renata Villela:
Poema Deficiências
"Deficiente" é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é dono do seu destino.
"Louco" é quem não procura ser feliz com o que possui.
"Cego" é aquele que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria, e só tem olhos para seus míseros problemas e pequenas dores.
"Surdo" é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e quer garantir seus tostões no fim do mês.
"Mudo" é aquele que não consegue falar o que sente e se esconde por trás da máscara da hipocrisia.
"Paralítico" é quem não consegue andar na direção daqueles que precisam de sua ajuda.
"Diabético" é quem não consegue ser doce.
"Anão" é quem não sabe deixar o amor crescer.
E, finalmente, a pior das deficiências é ser miserável, pois: "Miseráveis" são todos que não conseguem falar com Deus.
O poema expõe de modo ímpar as verdadeiras deficiências sociais, não aquelas que afetam os sentidos ou a locomoção, e sim nossa humanidade.
De que adianta gozar de perfeita condição física se isso não me torna mais humano, mais fraterno, mais altruísta, mais amoroso, mais tolerante, mais compreensível, mais flexível e, portanto, mais completo.
Somos obrigados a concordar que as pessoas “normais”, na maioria dos casos, são as mais deficientes da nossa sociedade, pois tendo tudo, não são capazes de doar nada ao seu semelhante, nem sua atenção, nem seu carinho, nem sua solidariedade.
De que adiantam duas pernas perfeitas se não as utilizamos para visitar nosso velho pai?
De que adiantam dois braços perfeitos se não os utilizamos para amparar nossa velha mãe já cansada da caminhada da vida?
Que valia tem dois olhos que nunca contemplam o nascer e o pôr do sol?
Que valia tem uma boca que nunca agradece, que nunca elogia, que nunca aconselha?
Nosso grande triunfo é saber que a deficiência da maioria das pessoas não depende de cirurgias, remédios ou aparelhos para ser vencida, e sim de uma mudança de vida.
E então, pronto para abandonar suas deficiências?