Perpétuo Vácuo - Parte 1
Houve um tempo em que olhar as estrelas me tornava tão pequeno, que a vida parecia um teorema indecifrável, tanto que me fazia pensar que não havia solução para a dissolução. Poeiras filosóficas infinitesimais se transformaram em aríetes contra a parede da minha mente. Um mundo pretensioso e devastado criava raízes em mim.
Silêncio e solidão, enganosamente, me pareciam as congratulações para uma jornada insidiosa por um inóspito vale de desencantos encantadores. A falsa premissa de grandiosidade começou a ruir, vagarosamente.. Castelo sobre areia.
Eu, de alguma forma, aprendi que “inteligência adquirida” causa ruptura, a habitabilidade anímica precisa elevar-se, pois se finge sentir asfixia entre “comuns”, e então começa-se a criar uma demanda viciosa por embate, por estilhaçamento. A primeira coisa a se quebrar é o coração, e a queda livre está só começando.
Qualquer mínimo senso moral definha, é colocado na balança da relativização, tudo ganha ares de vazio regrativo, as tênues demarcações limitantes simplesmente prescrevem. É apenas a primeira porta depois de se bater a milhões de quilômetros por hora contra você mesmo, olhando nos olhos do espelho.
Não sei se tudo embaça, ou os vultos das árvores se misturam na embriaguez existencial. Apenas vamos andando, o rumo transpassa o ritual social, transpassa a máscara da vida bela, e encontra a acrimônia humana. Tão severa, tão volátil, além dos comerciais da TV, ou das notícias no rádio, além da mentira toda goela abaixo. E mais portas abaixo se abrem.
Algum dia é manhã, e seu corpo não pode mais definir os limites do “você”, como numa alquimia você se mistura a outros, tão semelhantemente perdidos, fadados a um cinismo cenográfico e angustiante. Marcas na alma? Há um espírito, um caminho? Como poderia imaginar de dentro das ruínas do universo?
… Outra porta
Música bonita embala dias feios, letras de paz para corações em guerra. Ninguém sabe dizer, ninguém sabe o recado nas entrelinhas. Pregadores, magos, bruxos, pedintes, mendigos, prostitutas, bandidos, os homens mais justos… Quem podia apresentar a equação solucionada? Era assim a vida, saltando dos livros periféricos à realidade sentida, dos filmes emburrecedores, relações irrelacionadas intangíveis, imateriais. Como a minha visão de mundo… mais portas abaixo.
Realidade não é real. Acordar, alimentar, trabalhar, retornar… Envelhecer e morrer… Esquecer? Esquecido? Não importava em alguns dias. Ações autômatas não me diferenciavam de uma máquina… Uma máquina triste, com engates emocionais enferrujados, de perspectiva volúvel, com esperanças sem espera. As estrelas no céu, as cores, as pessoas caminhando num grande centro urbano, peixes no mar, palavras, sons… Seria possível algo além? Seria possível?