Nada em troca

Vivemos na expectativa do que nossas ações poderão provocar, não é verdade? Aliás só decidimos por algo quando temos aquela certeza de que seremos de alguma forma beneficiados pela nossa escolha. Mas viver assim, sempre na expectativa do que poderemos ter quando decidirmos ser é uma grande tolice que nos faz desperdiçar tempo e oportunidade. A graça da vida está em ser surpreendido por suas curvas e esquinas.

“Ouça, Virgínia, é preciso amar o inútil. Criar pombos sem pensar em comê-los, plantar roseiras sem pensar em colher as rosas, escrever sem pensar em publicar, fazer coisas assim, sem esperar nada em troca” (Lygia Fagundes Telles).

O fato é que vivemos em função da repercussão. “Como assim, plantar roseiras sem querer colher as rosas?”. Você pode ter pensado. “Não estaria a graça da coisa em depois poder ostentar o que fomos capazes de fazer?”. Também pode ter sido um pensamento. Mas não. Nada disso importa. Viver em função dos aplausos e dos tapinhas nas costas é uma coisa inútil, medíocre e que nos faz perder tempo. Precisamos viver pelo prazer de viver. Sem esperar nada em troca.

Porque quando vivemos na expectativa do que poderemos obter a partir dos nossos passos, vivemos uma constante frustração. Quanto mais nos esforçamos mais parece que fracassamos em nosso objetivo. Mas isso porque estamos vivendo do jeito errado. Quem disse que a vida tem que nos dar algo? Quem disse que as palavras escritas precisam, necessariamente, serem lidas e replicadas? Às vezes só precisamos que nossos sentimentos sejam colocados para fora, sem altas pretensões, sem objetivos altivos, apenas para que nossa alma se alivie. E além de a vida não ter que nos devolver coisa alguma, somos nós que precisamos oferecer algo a ela. O que você tem oferecido ao universo? Expectativas ou concretudes?

E quando fazemos coisas sem esperar nada em troca, acabamos nos permitindo às surpresas da estrada. “Só amarei se for amado. Só abraçarei se for abraçado. Só ajudarei se for ajudado”. E assim ninguém ama, ninguém abraça, ninguém ajuda. E todo mundo se isola em suas ilhas de expectativas irreais, inalcançáveis, ilusórias. Ao contrário, quem ama por amar, quem abraça por abraçar, quem ajuda por ajudar, pode acabar surpreendido quando um amor lhe for devolvido, um abraço for retribuído, uma ajuda for agradecida. Porque é na falta da expectativa que a gente se surpreende.

Porque a expectativa gera ansiedade. “Como será amanhã? Como será depois? Como estarei no futuro?”. E a ansiedade gera preocupação. “E se não for bom? E se der errado? E se não for como eu gostaria?”. Mas a aceitação é paciente e compreensiva. “Não importa que o amor que eu tenha compartilhado não me tenha sido devolvido hoje, o que importa é que alguém o sentiu”. Parece um ideal humano distante demais da nossa realidade? Experimente fazer algo sem a expectativa do depois. Apenas faça por fazer. Faça porque é de você. Faça porque é da sua essência. E nunca mais se preocupe com o amargo sabor da falta de reciprocidade. Porque ao não esperarmos nada em troca, entendemos uma coisa: emanamos ao universo aquilo que temos dentro de nós. Se estivermos ocos, nada emanaremos. Mas se estivermos enriquecidos, as estrelas brilharão junto a nós. E as surpresas virão. Naturalmente.

(Texto de @Amilton.Jnior)